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Ou conheça o post que originou tudo isso: “Títulos de nobreza, modo de usar”. 🙂
A pedido do Erick, escrevi este pequeno manual sobre o uso de títulos e conceitos de nobreza. Nove entre dez autores iniciantes de contos e romances de fantasia ambientam suas tramas na Idade Média europeia ou num mundo imaginário nela baseado. Em pelo menos oito dos nove casos, a referência única ou principal, tenham ou não consciência disso, é o mundo dos nobres e cavaleiros da Inglaterra medieval e usam títulos como “Lord” e “Sir”, pois tentam imitar autores britânicos ou estadunidenses de alta fantasia ou de fantasia histórica.
Mas em quase todos os casos é comum que cometam erros óbvios aos olhos de qualquer inglês, ou mesmo de qualquer um que conheça história ou literatura clássica. Provavelmente porque o Brasil não teve uma nobreza tradicional à moda europeia, salvo pela transplantada família imperial. Os títulos eram distribuídos pelo Imperador como se fossem condecorações e não eram hereditários.
Erros comuns incluem:
– dirigir-se a um rei como “Sua Majestade” (esse tratamento só se usa quando alguém menciona o rei a terceiros – o correto é Vossa Majestade);
– chamar filhos ou netos de um duque vivo de duques ou duquesas (como se “duque” fosse uma classe e não um título);
– chamar um nobre de “Lorde Paul” ou sua esposa “Lady Glaucia”. Nunca se usam esses títulos apenas com o primeiro nome, salvo para princesas britânicas – só com o nome completo ou o sobrenome. O mesmo se dá com o uso formal de “Senhor” ou “Senhora” em português;
– ou, pelo contrário, um cavaleiro de Sir Smith (esse título se usa apenas com o primeiro nome ou o nome completo) ou um nobre de Dom Ferreira (idem);
– usar Lorde para uma mulher (sempre “Lady”, salvo casos raríssimos) ou um rei (não se usa para reis, príncipes ou duques – só para barões, viscondes, condes e marqueses);
– não levar em conta a importância das distinções mais altas e, digamos, fazer um impostor fazer-se passar por “duque” com facilidade. Mesmo os maiores reinos nunca tiveram mais do que umas poucas dezenas de duques, nomes bem conhecidos: seria como tentar fazer-se passar por governador ou general no Brasil moderno;
– confundir “nobre” com “portador de título de nobreza”, quando a maioria dos nobres jamais teve títulos;
– chamar um rei pelo nome e sobrenome: isso nunca se usou. Filhos de príncipes, reis e imperadores têm apenas nomes de batismo. A partir da Baixa Idade Média começaram a adotar “nomes de reinado” numerados, que não são necessariamente os nomes de batismo.
– pensar na hierarquia tradicional de barões, viscondes, condes, marqueses e duques como se fossem etapas de uma carreira e as “promoções” fossem comuns. Eram raríssimas, não só na vida de um indivíduo, como na saga de uma linhagem ao longo das gerações.
Muitas das regras podem ter exceções, mas estas têm sua razão de ser e quando acontecem, merecem uma explicação. Também é certo que em mundos de alta fantasia, outras regras e títulos poderiam existir – mas neste caso, é preciso ser coerente e deixar claro como funciona o sistema. E nesse caso, não devia usar títulos realmente existentes com convenções de uso bem estabelecidas, como os de “lorde”, “sir” ou “marquês”.
ALTA IDADE MÉDIA
Eis um quadro-resumo bem simplificado do uso dos títulos na Alta Idade Média, seguido de uma explicação detalhada:
Posição | Saudação | Position | Salutation |
Imperador/ Imperatriz |
Vossa Majestade, Dom X |
Emperor/Empress | Your Majesty |
Rei/Rainha | Vossa Alteza, Dom X |
King/Queen | Your Highness |
Príncipe/ Princesa (*) |
Vossa Alteza, Dom X |
Prince/Princess | Your Highness |
Infante/Infanta (filho de rei) |
Dom X | Altheling | Sir |
Duque/ Duquesa |
Vossa Mercê, Senhor Duque de Z |
Duke/Duchess | Your GraceDuke / Duchess |
Marquês/ Marquesa |
Vossa Senhoria, Senhor Marquês de Z |
Marquess/Marchioness | Your Lordship/ LadyshipMy Lord/ Lady |
Conde/ Condessa |
Vossa Senhoria, Senhor Marquês de Z |
Earl/Countess | Your Lordship/ LadyshipMy Lord/ Lady |
Senhor/ Senhora |
Vossa Senhoria, Senhor de Z |
Lord/Lady | Your Lordship/ LadyshipMy Lord/ Lady |
Infanção/ Infançona |
Vós | Gentleman | Master |
(*) Na Alta Idade Média, nunca era filho de rei (este era infante) e sim pequeno soberano
Abaixo dos soberanos e suas famílias – imperadores, reis e príncipes – o sistema de títulos da alta nobreza mais generalizado no Ocidente tem cinco graus: duque, marquês, conde, visconde e barão. Os quatro primeiros se originam do Império Carolíngio (século IX), mas já haviam existido nos últimos séculos do Império Romano com sentidos em teoria não muito discrepantes dos que teriam no Império Carolíngio: o duque (dux exercituum, “chefe do Exército”) era o governador ou comandante militar de uma ou mais províncias e o conde (comes, “companheiro”), um ministro, cortesão ou emissário do imperador.
A grande diferença prática era que, no Império Romano, esses títulos eram pessoais, podiam ser revogados pelo imperador a qualquer momento e seus portadores eram remunerados em dinheiro, por meio dos impostos arrecadados pela burocracia imperial. Mas no Império Carolíngio, eram vitalícios de direito, hereditários de fato e inseparáveis da propriedade feudal de um território, maior ou menor. Com os mercados, as cidades e a circulação de dinheiro praticamente fora de questão, a forma de recompensar e remunerar um servidor era por meio de um feudo, de cuja terra e habitantes deveria tirar sua riqueza. Quem recebia o feudo tornava-se um vassalo (não confundir com súdito, que é qualquer um que esteja sujeito ao poder de um soberano) do superior, seu suserano.
A propriedade absoluta como a conhecemos hoje, que não traz quaisquer obrigações além de obedecer às leis, é chamada propriedade alodial e na Idade Média era uma rara exceção, na maioria das vezes reservada à Igreja. A propriedade feudal, principalmente nas origens, se parecia mais à noção moderna de concessão (como a de uma linha de ônibus ou uma frequência de rádio ou TV), que não pode ser cassada a não ser em caso de violação dos termos da outorga, mas também não pode ser vendida a terceiros e obriga a concessionária a prestar determinados serviços.
Da mesma forma, o vassalo feudal não podia vender ou dividir o feudo, mas também não podia perdê-lo enquanto não cometesse crimes graves e cumprisse suas obrigações, que incluíam fazer valer as leis civis e religiosas e prestar certos serviços ao suserano, principalmente militares (tipicamente 40 dias de serviço militar por ano, seus e de seus homens). Podia, em geral, ceder partes dele como feudos a vassalos menores, em troca de seus serviços: em relação a seu suserano, estes seriam chamados vavassalos (vassalos de vassalos) e podiam igualmente ser convocados a servir o suserano.
O poder militar de um senhor feudal, inclusive do próprio rei ou imperador, dependia de quantos vassalos fiéis podia mobilizar para a guerra e sua riqueza dependia de quanta terra mantinha sob seu controle direto. Um rei ou grande senhor podia, em tese, convocar todos os seus vassalos grandes e pequenos e, por meio deles, seus vavassalos, mas ante situações de rebeldia, só podia contar realmente com os pequenos senhores sob sua suserania direta.
A partir do século X, a lei passou a reconhecer a hereditariedade de direito dos feudos, há muito praticada de fato. Mesmo assim, quando falecia um vassalo feudal, seu sucessor – normalmente, seu filho homem mais velho – devia ir prestar homenagem ao suserano e jurar-lhe fidelidade para ser investido.
A forma mais comum de sucessão no feudo, chamada “primogenitura cognática”, veio a ser a herança pelo filho mais velho vivo e não havendo filho homem, para a filha mais velha, como na Inglaterra e na maior parte da França, Itália e Península Ibérica medievais. Embora ela tivesse o título por direito próprio, o título, direitos e obrigações passavam ao marido, se fosse casada. Em Portugal ele só tinha direito a usá-lo quando tivesse um herdeiro.
Já na Alemanha, partes da Itália do Norte e Europa Oriental, a regra era a “primogenitura agnática”: mulheres nunca herdavam. Na falta de filho varão, o título e o feudo passavam ao irmão mais novo, ou se esse estivesse morto, ao sobrinho. Se o senhor morto não tivesse filhos, irmãos ou sobrinhos, mas tivesse uma filha casada, então o título passava diretamente ao neto. Se não tivesse filha, mas sim uma irmã, então passaria ao filho desta, seu sobrinho.
Na França, a partir da Baixa Idade Média, foi praticada uma forma ainda mais radical de exclusão das mulheres, chamada “lei sálica” por ser alegadamente baseada nas leis dos francos sálicos da Antiguidade: reino, feudo e títulos não podiam ser herdados por mulheres, nem por linha feminina indireta. Usada como pretexto para impedir os reis ingleses de herdar o trono francês, foi imposta a ferro e fogo na Guerra dos Cem Anos e mais tarde foi adotada também nas monarquias de origem francesa, inclusive a casa italiana de Savóia, os Bourbon espanhóis e as dinastias impostas por Napoleão, e depois pelas monarquias balcânicas. Além de restringir as pretensões de famílias reais estrangeiras, a “lei sálica” também facilitava a centralização dos feudos nas mãos da monarquia: na falta de filho homem, o feudo revertia ao suserano.
Houve outras formas regionais mais raras de sucessão. Existiu o que se chamou “sucessão agnática”, na qual o feudo era herdado pelo homem mais velho da família. Na Rússia medieval, existiu a sucessão agnática em “escada”: o título ia para o irmão, mesmo havendo filho vivo, e com a morte do último irmão passava para a seguinte geração, a começar pelos filhos do primeiro irmão. Em Navarra (incluindo País Basco), houve a “primogenitura integral”: a herança ia para o filho ou filha mais velha, independentemente do sexo. Nos feudos fundados pelos lombardos, permitia-se a divisão ou compartilhamento pelos irmãos. E no caso dos reinos carolíngios e do Sacro Império Romano-Germânico, o soberano era escolhido por eleição entre todos ou os principais vassalos, embora isso normalmente fosse apenas uma confirmação da sucessão hereditária.
O imperador (em alemão Kaiser, literalmente “César”, feminino Kaiserin) era, na Idade Média ocidental, o soberano do Império Carolíngio e de seu sucessor Sacro Império Romano-Germânico (embora no Mediterrâneo Oriental existisse ainda o Império Romano do Oriente, hoje mais conhecido como Império Bizantino). O título implicava a pretensão de suceder aos antigos imperadores romanos e deter a supremacia em relação a reis e príncipes, mas isto só teve alguma realidade no século IX.
Quando o império foi dividido entre os filhos de Carlos Magno, um deles – o que reinava sobre a Itália – herdou o título de imperador e os outros, “meros” reis, deveriam ser seus vassalos. Mas em 888, seu descendente Carlos III foi deposto e substituído por um rei eleito em outra família, rompendo relações com o imperador reconhecido na Itália e Alemanha. No século seguinte, os carolíngios foram definitivamente afastados do poder, sucedidos pela dinastia dos otonianos na Alemanha e Itália e na França pela dinastia dos capetos.
O imperador continuou a ter a pretensão da supremacia sobre os outros reis cristãos, mas teve sua autoridade enfraquecida por não ser hereditário: o candidato, ainda que fosse normalmente filho ou irmão do imperador morto, precisava ser eleito Rei da Alemanha e depois ratificado como Imperador dos Romanos pela unção e coroação do Papa, conferidas em Roma.
A França passou a ser vassala apenas teórica do imperador até 1202, quando o Papa passou a reconhecer o rei como “imperador em seu próprio reino”. O imperador teve outros reinos vassalos – Itália, Alta e Baixa Burgúndia e Boêmia – mas suas coroas vieram a ser absorvidas pelo próprio Império. Os demais reis europeus também nunca deixaram de ser independentes na prática e a única precedência importante reconhecida ao Imperador na Baixa Idade Média foi a de comandar os exércitos cristãos nas Cruzadas.
Rei (em inglês king, feminino queen; francês roi, feminino reine; alemão König, feminino Königin) era o monarca de um Estado médio ou grande. No início da Idade Média, era na maioria dos casos (incluindo a Espanha dos visigodos, o reino das Astúrias, a Inglaterra anglo-saxônica, França, a Alemanha e a Polônia) um cargo vitalício, mas ao menos teoricamente eletivo e o soberano era um chefe militar e administrativo, não um monarca sagrado.
No princípio, todos os homens livres (os fidalgos do sexo masculino) podiam participar, em teoria, da eleição, contanto que se deslocassem até o local de sua realização. Na Polônia, essa prática perdurou até o final do século XVIII, mobilizando de 10 mil a 50 mil eleitores a cada vez, de uma nobreza com cerca de um milhão de membros (dos quais, uns 300 mil homens adultos) numa população total de dez milhões. Em outros casos, a assembleia de eleitores foi gradualmente reduzia a um punhado de senhores mais poderosos.
Na prática, o rei era quase sempre eleito dentro da dinastia reinante ou entre algumas das famílias mais poderosas, e a escolha era acertada entre estas antes de ser ratificada pela aclamação do restante da nobreza, mas tinha consequências políticas. O candidato precisava assumir compromissos formais (às vezes um programa de governo explícito) e fazer concessões aos grandes senhores, favorecendo sua autonomia.
Entre a morte do rei e a coroação do sucessor, dava-se um interregno. Na Polônia, durante esse período, a chefia do Estado cabia ao primaz, arcebispo de Gniezno, que assumia o cargo de interrex ou regente. Da eleição à coroação (o que podia levar meses), o soberano não era considerado “rex” (rei) e sim “dominus” (“dom”, em inglês lord). A França começou a romper com essa tradição no final do século X, quando a eleição do herdeiro passou a acontecer em vida do rei, para que este controlasse o processo e o reduzisse a mera formalidade e o sucessor assumisse imediatamente o trono com plenos poderes.
Os filhos do rei, mesmo onde a sucessão se tornou hereditária, não eram considerados senhores ou príncipes, mas meros infantes, feminino, infantas (em inglês, æthelings ou athelings, em francês enfants).
Príncipe (“o primeiro a pegar”) foi na Roma republicana o título do chefe do Senado romano, que depois foi apropriado pelo imperador romano como seu principal título civil (o de “imperador” era originalmente apenas militar). Na Idade Média, com o sentido de “primeiro, sem ninguém acima de si”, era o título em geral de um monarca que se considerava soberano de direito ou de fato (e nesse sentido é usado por Maquiavel em O Príncipe), mas em especial dos menores, que não eram capazes de reivindicar o título de “rei”.
O primeiro a usá-lo nesse sentido específico foi o duque de Benevento, no sul da Itália, ao se declarar independente dos reis da Lombardia, no século VIII (embora depois tivesse que reconhecer a suserania dos imperadores carolíngios). Também foi adotado pelos pequenos soberanos bretões de Gales no século XII, quando se integraram ao sistema feudal como vassalos nominais do rei da Inglaterra.
Na Europa Oriental, “príncipe” (knyaz em russo) era o título de um senhor semi-independente, comparável aos duques da Europa Ocidental. O chefe de uma aliança de príncipes era o “grão-príncipe” (velikiy knyaz). Esses títulos foram também traduzidos como duque e grão-duque.
Um duque, geralmente pertencente à elite dos conquistadores francos, era o governador de uma grande província, tipicamente do tamanho de uma grande região de um país moderno (como a Bretanha, a Baviera, a Borgonha etc.) ou um pequeno país (como a Holanda), que nos primeiros tempos normalmente correspondia a uma arquidiocese, tipicamente com duzentos mil a trezentos mil habitantes. O termo alemão é Herzog, que originalmente se referia ao líder supremo de uma grande tribo germânica. O inglês é duke, feminino duchess. Nos países eslavos, o equivalente é voivode – e esse é o verdadeiro titulo do Drácula no romance de Bram Stoker, embora o autor o interprete, equivocadamente, como “conde”. Durante parte do século X, o duque da Lotaríngia, que antes tinha sido um reino, foi intitulado arquiduque, como uma distinção especial.
Um duque medieval podia ser tão rico e poderoso quanto um rei, ou ainda mais. O próprio rei dependia, para recrutar suas tropas e arrecadar seu tesouro, das terras que detinha como duque. O rei da França, por exemplo, retirava sua renda e os cavaleiros mais fiéis de seu Ducado de Paris, mas outros ducados seus vassalos podiam ser mais ricos e prósperos. Seus duques só eram obrigados a servi-lo por tempo limitado e, caso se rebelassem e unissem suas forças, podiam reunir um exército muito maior que o seu.
Em termos de caracterização, um duque da Alta Idade Média (até o ano 1000), como também os mais importantes da Baixa (de 1000 a1453) e do início da Idade Moderna, são senhores com um castelo, uma corte, um tesouro e um exército tão imponentes quanto os do soberano. Sua dinastia e sua ligação com seus súditos talvez remonte a tempos anteriores à própria fundação do reino e seus vassalos provavelmente o seguirão caso decida se rebelar. Muitos duques conspiraram para se tornarem independentes ou tomar o trono, ou teceram estratégias de casamentos entre sua família e a do soberano de maneira a garantir que seus descendentes herdassem o trono. Se você é fã da Guerra dos Tronos e se lembrou de Tywin Lannister, pensou bem: ele foi inspirado nos duques de Lancaster da história real.
Será spoiler lembrar que a rainha Elizabeth II é também, ainda hoje, a Duquesa de Lancaster e tira do arrendamento dessas terras toda a sua pompa e circunstância? Só o GRRM sabe.
Um marquês era o governador de uma marca (fronteira), estrategicamente importante por estar na linha de frente da defesa do império, sujeita a invasões. Por exemplo, a Marca de Espanha (atual Catalunha, na fronteira do califado de Córdoba), ou a Ostmark ou Marca da Áustria (na fronteira com os húngaros). Prestava vassalagem diretamente ao soberano e, militarmente, tinha uma importância equivalente a um duque, apesar de deter territórios geralmente menores, menos ricos ou menos povoados. Na Alemanha, se usa o nome de margrave (Markgraf, literalmente “governador da fronteira”), feminino margravina. Em inglês é marquess, feminino marchioness.
Quem quiser um marquês medieval como personagem deve pensar nele como um senhor feudal mais rude e menos acostumado ao luxo que um rei ou duque. Provavelmente suas terras são mais pobres e inóspitas, mas é mais aguerrido. Está acostumado com perigos, dificuldades e a ameaça de invasores estrangeiros e tem a seu dispor centenas de vassalos bem preparados para pegar em armas. Em caso de guerra, é capaz de enfrentar um duque de igual para igual. Se você conhece a Guerra dos Tronos, pensou, com razão, em Ned Stark.
Um conde palatino (“do palácio”) era um ministro importante, principalmente o administrador de castelos e terras sob o domínio direto do soberano. Na Alemanha, se diz Pfalzgraf (“governador do palácio”). Na Alta Idade Média, não havia “capitais” e o soberano viajava entre seus vários castelos e propriedades espalhados pelo reino e dependia delas para sustentar suas despesas, sua corte e seus exércitos próprios (além dos que podia convocar por meio dos vassalos). Cada um desses castelos e seu território era chamado um “palatinado”.
Além de aconselhar o soberano e comandar suas tropas, esses eram os homens mais importantes para fazer valer o poder do soberano frente aos seus duques e marqueses, dos quais não podia depender nem confiar totalmente. Não foi a toa que seu título deu origem à palavra paladino, de início sinônima: era o combatente do rei ou imperador por excelência.
Um conde era o governador de uma região menor, subdivisão de um ducado e na origem geralmente correspondente a uma diocese da Igreja, depois frequentemente menor que isso. Em geral, com a extensão de algumas centenas a alguns milhares de quilômetros quadrados e talvez uns cinco mil a vinte mil habitantes. Em geral, não era franco e sim membro da elite dos galorromanos conquistados. Na Alemanha, se chama landgrave (Landgraf, “conde da terra”), feminino landgravina.
Na Inglaterra se diz earl (originalmente, “chefe”) para os condes britânicos, mas count para os do continente, embora o feminino seja sempre countess. Diz a lenda que os normandos preferiram o termo anglo-saxão para evitar trocadilhos com cunt.
Vassalo de um duque ou do rei, um conde tem um ou vários castelos, provavelmente pequenos – não mais que uma torre de menagem – e mora num deles, junto com sua família e os nobres que lhe servem permanentemente de guarda-costas, camareiros (valetes ou pajens), escudeiros e administradores do castelo e do feudo, dos quais o mais importante é o intendente ou vice-conde (depois, visconde). Estes têm às suas ordens muitos serviçais plebeus que, recrutados entre os servos, fazem o serviço pesado sob suas ordens e dormem no chão. Junto do castelo ou à sua vista, provavelmente há uma vila murada onde vivem e trabalham ferreiros e outros artesãos. Para além, há dezenas de pequenos feudos de vassalos que em caso de necessidade do conde (ou de seu suserano) pode convocar para servi-lo como cavaleiros ou capitães. Um grande condado, com vários castelos, podia ser dividido em castelanias, cada uma governada por um castelão designado pelo conde.
Nas línguas germânicas, castelo é burgo, palavra que mais tarde veio a significar também “cidade” porque a maioria das cidades da Europa do Norte e Central surgiu das vilas amuralhadas de artesãos e comerciantes que se formaram à sombra da proteção dos castelos. Nas línguas latinas, a palavra “vila” também significava, originalmente, tanto a residência do senhor feudal quanto o povoado formado à sua volta, mas se manteve distinta de “cidade”, entendida na Idade Média como um povoado amuralhado que servia de sede a uma diocese ou bispado e geralmente era de origem romana, anterior ao feudalismo. O bispo, cuja jurisdição frequentemente coincidia com a do conde, tinha prestígio equivalente e podia ser tanto um aliado quanto um contrapeso a seu poder.
Pode-se pensar num conde como o senhor feudal arquetípico dos filmes e romances e também como uma interpretação realista desses pequenos “reis” de contos de fadas, tão numerosos e prontos a oferecer a mão da “princesa” a um jovem hábil e corajoso, sempre um filho caçula de uma família modesta. Este, de forma igualmente “realista”, deve ser interpretado como um filho cadete (quer dizer, não primogênito) de um pequeno senhor feudal, que não tinha direito à herança e se punha a serviço permanente de um senhor feudal (não necessariamente o suserano do pai). Se conseguisse agradar muito o conde e este só tivesse filhas mulheres, a possibilidade de se casar com a mais velha e herdar o condado para si e seus descendentes de fato existia.
Um visconde (literalmente, vice-conde, vicomte em francês e alemão, viscount em inglês) era o lugar-tenente de um conde, seu segundo no comando e às vezes administrador, quando um conde estava ausente ou possuía mais de um condado. Em alguns outros países, como a Inglaterra, o visconde surgiu do xerife (sheriff) chefe escolhido pelos plebeus para representá-los junto ao conde, que gradualmente tornou-se um posto hereditário e aristocrático. Na França também existiu o titulo equivalente de vidame, que era um senhor laico encarregado de administrar as terras e a defesa de um senhor eclesiástico (bispo, arcebispo ou abadia).
Um castelão (em francês, châtelain) era o administrador e comandante de uma castelania, uma subdivisão de um condado sediada num pequeno castelo. Na Alemanha, se chama burgrave (Burggraf, “governador do castelo”). Esses títulos chegaram a se tornar também hereditários, mas acabaram confundidos com o de visconde.
Um senhor (em francês, seigneur, alemão Herr, inglês lord of the manor) não titulado geralmente tinha um pequeno feudo de base ou “senhoria”, de algumas centenas ou milhares de hectares (o tamanho de uma típica fazenda brasileira). Não tem castelo nem vassalos, mas possui um “solar” ou casa senhorial, na qual vivem sua família, escudeiro e serviçais. Tem também poder sobre algumas dezenas de famílias de servos obrigados a cultivar suas terras e lhe prestar outros serviços e jurisdição, como representante da lei, sobre os homens livres que vivessem em seu feudo, uns e outros geralmente reunidos numa aldeia ou vila.
Como vassalo, deve servir seu suserano, geralmente como cavaleiro. Mas “cavaleiro” era na Alta Idade Média uma função militar efetiva, não um título hereditário, nem uma mera honraria.
Vale notar, porém, que fora do âmbito do antigo Império Carolíngio, o uso de títulos só se generalizou para a alta nobreza na Baixa Idade Média ou na Idade Moderna. Era o caso de Portugal, onde muitos grandes senhores (conhecidos como “ricos-homens”) não tinham título especial, mas eram de fato equivalentes a condes ou duques de outros países.
Um infanção em português medieval, feminino infançona, cavalheiro, gentil-homem ou fidalgo em português moderno (francês gentilhomme, inglês gentleman, alemão junker, originalmente junger Herr, “jovem senhor”) são os filhos e filhas do senhor, bem como todos os nobres de nascença que não detinham um feudo – a grande massa da pequena nobreza, chamada gentry em inglês (em contraste com a nobility, dos nobres titulados). Um jovem fidalgo solteiro, em português antigo, era chamado donzel; e uma solteira de qualquer idade, uma donzela, que ao se casar, se tornava uma dama.
O filho mais velho normalmente herdaria o feudo do pai, mas os cadetes teriam de se arranjar de outra maneira. Uma era entrar para o clero. Outra era servir militarmente um grande senhor ou do próprio rei como escudeiro, cavaleiro, porta-bandeira (alferes) ou capitão. A terceira era para o serviço do castelo e da administração do feudo, que tinha várias funções reservadas à nobreza:
Todos esses eram cargos honrosos e reservados à nobreza, em contraste com os serviçais plebeus ou “lacaios” que serviam sob suas ordens, e quando estavam às ordens de um rei ou grande senhor, podiam ser mais poderosos que seus vassalos. Os principais ministérios e alguns comandos militares das monarquias tradicionais evoluíram a partir desses cargos, que às vezes eram transmitidos hereditariamente.
A nobreza representava, geralmente, cerca de 5% da população e os servos, 90% ou mais. Entre uns e outros, podia haver uma camada de homens livres – artesãos, pequenos comerciantes, camponeses livres – que em grande parte da França e Alemanha eram quase que só os habitantes dos burgos, os burgueses. Em algumas regiões eram mais comuns os camponeses livres, pequenos proprietários de terras próprias ou arrendadas (tipicamente 12 a50 hectares– seriam “sitiantes” em termos de Brasilmoderno) que frequentemente tinham um papel militar importante, como arqueiros, sargentos e mesmo cavaleiros (na Inglaterra, eram os yeomen ou franklins). Além disso, podia haver escravos: era permitido escravizar os não-cristãos capturados na guerra, tanto os eslavos pagãos (dos quais vem a palavra “escravo”), quanto os muçulmanos do mundo árabe.
Note-se que o feudo e o título eram funções, privilégios e encargos pessoais, não uma qualidade nem uma casta. O filho de um duque, mesmo que seja o herdeiro, não é duque enquanto o pai for vivo. Muito menos os filhos cadetes (não herdeiros) ou as filhas. Na Alta Idade Média não tinham títulos (embora fossem fidalgos) e pela lei britânica são considerados “comuns” (ou seja, não têm os privilégios legais dos lordes). Nem mesmo o herdeiro do rei tinha um título especial: esse costume, veremos depois, surgiu no século XIV.
A esposa (digamos) de um duque tem o título de duquesa, embora isso não signifique mais que supervisionar o serviço do castelo (chefiado pelo “veador”) e receber os hóspedes. Ela continua a deter o título como “duquesa viúva” (em inglês, dowager duchess) ou “duquesa-mãe” e só o perde se voltar a se casar (e em tempos modernos, ao se divorciar). A viuvez era, na Idade Média, praticamente a única situação que possibilitava a uma grande dama exercer poder, ao menos enquanto o herdeiro fosse menor.
Portanto, pode haver mais de uma mulher com o mesmo título, mas nunca mais que um detentor masculino. Em 1952, quando morreu o rei George VI, o Reino Unido teve por algum tempo três rainhas vivas: a rainha propriamente dita Elizabeth II, herdeira reinante por direito próprio, a mãe Elizabeth, viúva de George VI e a avó Mary, viúva de George V.
Era muito raro que alguém ascendesse de título sem ser por herança. Embora o rei pudesse em tese elevar plebeus a nobreza, criar novos ducados ou condados ou converter um condado em ducado, raramente o fazia, o que geralmente era um evento histórico de certa importância e o reconhecimento de uma situação de fato.
Ainda que não tivesse título especial, um fidalgo fazia jus a tratamento diferenciado na linguagem. No mínimo, o uso do “vós” plural, em vez do plebeu “tu” por parte de pessoas que não fossem do mesmo núcleo familiar. O sentido implícito é que, quando um estranho se dirige a um nobre – amigo ou inimigo, inferior ou superior –, não trata apenas com um indivíduo, mas com uma família e uma linhagem a ser coletivamente honrada ou ofendida.
No entanto, apenas um soberano usa “nós” para falar de si mesmo. Isso hoje se chama “plural majestático”, mas na Idade Média, o tratamento de “Vossa Majestade” só era usado pelo imperador. Os reis e príncipes eram “Vossa Alteza” e às vezes “Vossa Mercê”, como também os duques – até que esse tratamento se popularizou e generalizou tanto que foi reduzido a vosmecê, depois a você. Senhores menores eram “Vossa Senhoria” e “Senhor” Fulano.
Não se usava sobrenomes: as pessoas eram conhecidas pelo primeiro nome ou nome de batismo, acompanhado pelo nome do pai quando era necessário distinguir homônimos – o chamado patronímico. Por exemplo:em português, Afonso Henriques(Afonso, filho de Henrique);em inglês, William Johnson(William, filho de John);em russo, Dmitri Ivanovich(Dmitri, filho de Ivan) ou Anna Ivanovna (Anna, filha de Ivan);em francês, Charlesfils de Gerald ou Charles Fitzgerald;em gaélico, Fergusmac Echdach (Fergus, filho de Echdach).
A exceção foram os irlandeses: já na Alta Idade Média, a partícula O’, que originalmente significava “neto de”, tomou o sentido de “descendente de” e sobrenomes formados com ela passaram a ser usados como nome de clã e herdados como os sobrenomes modernos.
Apelidos e cognomes também eram frequentemente usados para distinguir indivíduos, como “Carlos, o Calvo” (rei da França), ou “Henrique, o Passarinheiro” (caçador de passarinhos e soberano do Sacro Império), bem como nomes relativos à origem ou lugar de nascimento, como “Pepino de Heristal”, ou ao nome do feudo ou senhorio, como “Leopoldo de Baviera”.
BAIXA IDADE MÉDIA
A hierarquia feudal carolíngia da Alta Idade Média tinha uma estrutura razoavelmente simples e lógica. Numa comparação informal com o Brasil moderno, o ducado seria como um “estado”, um marquesado um “território”, um condado um “município” (os condados palatinos, por assim dizer, os “distritos federais”) e a castelania um “distrito” rural, enquanto as “senhorias” poderiam ser comparadas às fazendas de “coronéis”.
Na Baixa Idade Média, as coisas começaram a ficar mais confusas. As nações da periferia europeia – Hungria, Polônia, Inglaterra (a partir da invasão normanda), Escócia e os reinos ibéricos, balcânicos e nórdicos – começaram a copiar o sistema carolíngio, mas às vezes mudando ou reinterpretando seus conceitos. As crises de sucessão e o enfraquecimento da autoridade dos reis e imperadores tornaram-se ocasião para senhores feudais lutarem entre si, fundindo, subdividindo e alterando os limites dos feudos originais, enquanto outros eram pacificamente reunidos ou partilhados em virtude de estratégias matrimoniais, doações ou acordos de sucessão segundo leis locais. As antigas “marcas” foram plenamente incorporadas à civilização, perdendo seu caráter militar e fronteiriço.
Tornou-se comum que um grande senhor possuísse ao mesmo tempo vários feudos. Em alguns casos, passavam a ter mais de um suserano. E de forma geral, o título deixou de ser uma indicação certa da extensão real do poder de um senhor feudal: perdas territoriais e subdivisões significavam que alguns ducados tinham a extensão do que outrora tinha sido um mero condado (como, por exemplo, o Brabante, na atuais Bélgica e Holanda), enquanto alguns condes assumiam o controle de vários condados e ducados e se tornavam tão poderosos quanto os antigos duques, como foi o caso dos condes de Anjou e Toulouse, na França.
Outra mudança importante foi a consolidação gradual de um novo modelo de comportamento para a nobreza, o cavalheirismo. O nobre da Alta Idade Média tinha sido quase sempre analfabeto, grosseiro e com pouca consideração sentimentos delicados, mas a Baixa Idade Média procurou cultivar as boas maneiras, a poesia, o amor cortês e o respeito pelas damas da nobreza.
Também nessa época, toma forma a noção de cavalaria como instituição idealizada e cavalheiresca, explicada com mais detalhe no final deste texto. Ao mesmo tempo, surgem as ordens religiosas de cavalaria, criadas para combater muçulmanos e pagãos a serviço da Igreja, e também cavaleiros plebeus ou cavaleiros-vilões, a partir dos exércitos das cidades-estado, que cada vez mais se tornavam potências econômicas e militares. Muitas delas eram vassalas de um rei ou nobre poderoso, mas outras se tornaram realmente independentes, principalmente as do norte da Itália. Nos vales alpinos, também houve comunidades de camponeses livres que se rebelaram contra seus senhores feudais e se organizaram como pequenas repúblicas independentes, cuja aliança deu origem à Suíça.
Outro desenvolvimento da Baixa Idade Média é o surgimento dos brasões. Inicialmente pintados nos escudos como identificação pessoal de cavaleiros cobertos por elmos, principalmente nas justas, passaram gradualmente a ser símbolos hereditários (na Alta Idade Média e até as cruzadas, os escudos raramente usavam pinturas). No início, o cavaleiro só podia pintar seu escudo após conquistar sua primeira vitória: antes disso, era chamado “cavaleiro novel”. Pouco a pouco, o desenho dos brasões tornou-se mais complexo e codificado, com diferentes símbolos denotando o título ou estatuto exato do portador. Nas grandes casas nobres e reais, as cores e signos do brasão foram adotados também na libré dos servidores e nas bandeiras que representavam a si e seus servidores e exércitos. Foi só depois da Revolução Francesa que as bandeiras passaram a representar nações.
Também nessa época, começou o uso sistemático de sobrenomes hereditários, inicialmente na nobreza, depois aos plebeus, até se tornarem obrigatórios na Idade Moderna (inclusive para os judeus, que de início resistiram a seu uso). Quando os Estados tomaram proporções maiores que as de um pequeno feudo e as cidades ganharam maiores proporções, as pessoas começaram a ser nomeadas sistematicamente nos documentos não só pelo nome de batismo, como também pelo apelido ou alcunha pelo qual fossem conhecidos (John, the Smith / João, o Ferreiro), para distingui-los de homônimos, e esses apelidos acabaram por se transformar em sobrenomes de família (John Smith / João Ferreira).
No caso de plebeus, os nomes de família podiam ter diferentes significados originais: ocupação como “Ferreira” e “Monteiro”; patronímicos como “Álvares” ou “Peres”; alcunhas por características físicas ou de temperamento como “Moreno” ou “Bravo”, às vezes representadas como animais como “Lobo” ou “Cordeiro”; dedicação religiosa como “dos Anjos” e “da Conceição” (comum em órfãos criados em conventos, depois também em escravos); origem geográfica como “Braga”, “Lisboa” ou “da Costa”; ou ainda nome de propriedades rurais ou de sua produção mais conhecida, como “Oliveira” ou “Pereira”.
No caso dos nobres, os nomes de família podem derivar do “solar”, o nome da, casa senhorial ou castelo de onde se originaram. Em Portugal, isso não era uma regra, mas em outros países, era uma prática mais sistemática. Na França, as famílias originárias da nobreza quase sempre têm um “de” no nome, mas isso não é necessariamente indicativo de nobreza, pois muitos plebeus também o têm (geralmente indicando origem geográfica). Em alemão, porém, o uso de “zu” ou “von” é indicador quase certo de origem nobre.
Mas os reis e outros soberanos – e, na França e Alemanha, também os condes, marqueses, duques e príncipes semi-independentes – continuaram a não usar sobrenomes. Mesmo em tempos modernos, geralmente recebem apenas nomes de batismo. Por exemplo, D. Pedro II foi batizado “Pedro de Alcântara João Carlos Leopoldo Salvador Bibiano Francisco Xavier de Paula Leocádio Miguel Gabriel Rafael Gonzaga”, uma série de homenagens a santos sem nenhum sobrenome. O nome de batismo da rainha Elizabeth II é “Elizabeth Alexandra Mary”. O primeiro era da dinastia dos Bragança e a segunda da dinastia de Windsor (antiga Saxe-Coburgo e Gotha), mas isso não é incorporado como sobrenome a seus documentos.
Praticamente a única situação em que reis têm sobrenomes é a de reis depostos aos quais o sobrenome é imposto para igualá-los a outros cidadãos – como quando Luís XVI, por batismo Louis Auguste, se tornou “cidadão Capeto” ou Luís Capeto pouco antes de ser decapitado.
Na Baixa Idade Média, os reis começaram, além disso, a serem numerados para serem distinguidos de antecessores com o mesmo nome e a adotarem um “nome de reinado”, que tanto podia ser um nome de batismo quanto um nome escolhido arbitrariamente, talvez para homenagear um monarca anterior. Anteriormente, essas práticas eram exclusivas dos papas.
Consolidou-se na Baixa Idade Média mais um título hereditário, o de barão, feminino baronesa. Na França referia-se a pequenos vassalos que serviam diretamente os reis (ou aos duques mais poderosos), destacando-se assim da massa dos vavassalos sem contato direto com o palácio. A palavra era originalmente uma mera variante de “varão”, homem, no sentido de “homem do rei” e só sé tornou um título hereditário no século XIV, ou seja, na Renascença. Na Alemanha, o título dos pequenos vassalos do Imperador era Freiherr (feminino Freifrau).
Na Inglaterra, foi tomada originalmente como sinônimo de “senhor”, mas distinguindo-se entre os “barões maiores”, que possuíam várias senhorias e eram convocados pessoalmente pelo rei aos conselhos reais e “barões menores”, que possuíam apenas uma e eram convocados pelos sheriffs (governadores ou bailios). Só os “barões maiores” vieram a se tornar hereditários e membros permanentes da Câmara dos Lordes, também no século XIV, enquanto os menores se diluíram na pequena nobreza.
Vale notar que, no uso moderno, alguém ser conhecido em inglês como “Lorde Fulano de Tal” significa que é um barão (o grau menor dos lordes britânicos), pois ele usaria um título mais alto, se o tivesse. Mas na Idade Média, a tradução apropriada seria “Senhor”.
IDADE MODERNA
Abaixo, um quadro-resumo simplificado de títulos e tratamentos na Idade Moderna, seguido abaixo por explicação detalhada. No quadro X representa um nome de batismo ou nome de reinado; Y um sobrenome ou nome de família e Z o nome de um senhorio.
Em Português
Posição | Endereçamento | Saudação |
Imperador/Imperatriz | Sua Majestade Imperial, Dom X | Vossa Majestade Imperial |
Rei/Rainha | Sua Majestade, Dom X | Vossa Majestade |
Príncipe/Princesa (herdeiro) | Sua Alteza Real, Dom X | Vossa Alteza Real |
Infante/Infanta (família real) | Sua Alteza Real, Dom X | Vossa Alteza Real |
Príncipe/Princesa (soberano) | Sua Alteza Sereníssima, Dom X | Vossa Alteza Sereníssima |
Príncipe/Princesa (honorário) | Sua Alteza Ilustríssima | Vossa Alteza Ilustríssima |
Grão-duque | Sua Alteza Real, Dom X | Vossa Alteza Real |
Grande do Reino / Par do Reino | Excelentíssimo senhor Duque de Z | Vossa Excelência |
Duque/Duquesa | Excelentíssimo senhor Duque de Z | Vossa Alteza |
Marquês/Marquesa | Ilustríssimo senhor Marquês de Z | Vossa Senhoria |
Conde/Condessa | Ilustríssimo senhor Conde de Z | Vossa Senhoria |
Visconde/Viscondessa | Ilustríssimo senhor Visconde de Z | Vossa Senhoria |
Barão/Baronesa | Ilustríssimo senhor Barão de Z | Vossa Senhoria |
Senhor/Senhora | Ilustríssimo senhor de Z | Vossa Senhoria |
Baronete/Baronetesa | Ilustríssimo Senhor/Senhora (X) Y | Senhor/Senhora (X) Y |
Cavaleiro/Dama | Ilustríssimo Senhor/Senhora (X) Y | Senhor/Senhora (X) Y |
Escudeiro | Ilustríssimo Senhor/Senhora (X) Y | Senhor/Senhora (X) Y |
Nobre | Ilustríssimo Senhor/Senhora (X) Y | Senhor/Senhora (X) Y |
Em Inglês
Position | Adressing | Salutation |
Emperor/Empress | HIM The Emperor | Your Imperial Majesty |
King/Queen | HM The King/Queen | Your Majesty |
Crown Prince/Princess | HRH The Prince of Z | Your Royal Highness |
Prince/Princess(of blood) | HRH The Prince X | Your Royal Highness |
Prince/Princess (sovereign) | HSH The Prince of Z | Your Serene Highness |
Grand-Duke | HRH The Grand Duke of X | Your Royal Highness |
Duke/Duchess | His Grace The Duke of Z | Your Grace |
Marquess/Marchioness | The Most Hon The Marquess of Z | Your Lordship/Ladyship, My Lord/Lady |
Earl/Countess | The Rt Hon The Earl of Z | Your Lordship/Ladyship, My Lord/Lady |
Viscount/Viscountess | The Rt Hon The Viscount Y | Your Lordship/Ladyship, My Lord/Lady |
Baron/Baroness | The Rt Hon The Lord Y | Your Lordship/Ladyship, My Lord/Lady |
Lord/Lady | The Lord Y | Your Lordship/Ladyship, My Lord/Lady |
Baronet/Baronetess | Sir/Dame X(Y) | Sir/Madam |
Knight/Dame | Sir/Dame X(Y) | Sir/Madam |
Esquire/Esquiress | X, esquire | Mister/Mistress |
Gentleman, Gentlewoman | X, gentleman | Mister/Mistress |
Na Idade Moderna, o feudalismo pouco a pouco foi abolido. Região por região, gradualmente ou de forma brusca (exceto nas áreas mais atrasadas), os servos foram transformados em camponeses livres e as propriedades feudais se tornaram propriedades alodiais, quer dizer, propriedades imobiliárias no sentido moderno, livres de obrigações e passíveis de serem compradas e vendidas, às vezes também partilhadas entre herdeiros.
Isso resultou em dois tipos divergentes de evolução. No Sacro Império, com o enfraquecimento da autoridade do Imperador, os feudos seus vassalos se tornaram, pouco a pouco, pequenos estados semi-independentes e depois da Paz de Westfália (1648) independentes para quase todos os efeitos, até a reunificação alemã de 1870. Os antigos senhores tornaram-se governantes soberanos, mesmo que vendessem seus imóveis.
Nos outros países, os feudos foram, pelo contrário, submetidos aos reis e gradualmente se tornaram meras propriedades imobiliárias. Às vezes, essas propriedades acabaram sendo na maior parte ou inteiramente vendidas, incluindo o “solar” (a sede originária da família feudal). No caso das grandes casas tradicionais, restaram mesmo nesse caso os títulos (um ou muitos) como uma espécie de propriedade imaterial ou “virtual” que continuou por muito tempo a proporcionar honrarias, privilégios legais (como, na Inglaterra, o assento na Câmara dos Lordes) e acesso preferenciais ao rei, à corte e aos cargos públicos. Vale notar que a compra das terras, solar ou castelo de um senhorio com título não confere um título ao comprador. O plebeu que comprasse as terras e o solar de um baronato não se tornava barão de X (embora pudesse ser chamado “o senhor do baronato de X”). Ainda assim, a maioria dos plebeus nobilitados procurava comprar terras, pois sua propriedade continuava a ser fortemente associada à aristocracia e era um símbolo de ascensão social, mais que o dinheiro.
O poder dos reis atingiu então o auge, desembocando no absolutismo e, nos casos mais extremos, na doutrina do seu “direito divino”, independente de confirmação da Igreja, da nobreza, do povo ou de outros poderes. Como símbolo dessa prerrogativa, veio a exigência do uso do título de “Vossa Majestade” pelos reis europeus, com apoio do Papa, para sublinharem sua igualdade com o imperador Carlos V, que insistia particularmente nesse título.
A herança do título tornou-se mais problemática. A herança de sogro a genro ou de irmão a irmão, antes automática na ausência de filhos, deixou de existir: na ausência de filhos homens, o título voltava às mãos do rei, que podia extingui-lo ou concedê-lo a outra pessoa sua vontade (na Inglaterra, a herança de pai para filha se aceitava nas casas mais antigas e tradicionais, desde que fosse filha única, mas não para o genro). Também voltaram a existir títulos vitalícios, não hereditários. Na França eram relativamente comuns. Na Inglaterra, eram raros até meados do século XIX, mas então começaram a ser concedidos sistematicamente (quase sempre como “barão”) a políticos não aristocratas, para serem admitidos na Câmara dos Lordes. No Brasil, foi o único tipo de título que chegou a existir.
Já no caso dos soberanos, cresceu a preocupação com não deixar extinguir a linha de sucessão e ter de entregar o trono a um monarca estrangeiro. Naqueles que seguiam a lei sálica, aumentou a tendência de identificar e privilegiar os parentes colaterais que poderiam herdar o trono se o rei não tivesse filhos. Em outros, surgiram precauções especiais para garantir a continuidade da independência no caso de o reino ser herdado por uma mulher. Nesse caso, ela seria rainha ou imperatriz e exerceria de fato a monarquia. No caso do Reino Unido, seu marido sequer teria o título de rei, mas apenas de príncipe consorte. Em Portugal e no Brasil, teria o título de Rei ou Imperador apenas depois de ter gerado um herdeiro e de forma honorífica – os poderes monárquicos continuariam a ser apenas da esposa.
Na maioria dos casos, os nobres titulados continuaram a ser grandes proprietários de terras e, a grosso modo, um duque continou a ser, em média, mais rico e influente que um marquês e assim por diante. Mas a chave de seu poder deixou de ser (salvo na Alemanha) a força militar que poderia tirar delas, pois esta foi monopolizada pelo rei. Passou a ser sua presença na corte, seus cargos no governo e suas relações de amizade e parentesco com o rei e com outras famílias poderosas.
A arte da adulação atingiu seu apogeu, exigindo fórmulas elaboradas e precisas para se dirigir a cada indivíduo de distinção, conforme a situação: o conhecimento exato das regras e exceções era vital. Na corte inglesa do século XVII, um duque devia ser tratado por escrito como “Most High, Potent, and Noble Prince” (Altíssimo, poderoso e nobre Príncipe), mas se fosse de sangue real, seria “Most High, most Mighty, and Illustrious Prince” (Altíssimo, Poderosíssimo e Ilustre Príncipe) e um marquês, “most Noble, most Honourable, and Potent Prince” (Nobilíssimo, Ilustríssimo e Poderoso Príncipe).
A ascensão de título e a concessão de novos títulos tornou-se mais comum e os reis passaram a criar também títulos não hereditários, regulando cuidadosamente seu uso como forma de manipulação política e social.
A nobreza distanciou-se das atividades práticas e passou a se pretender distinguir da burguesia pela cultura, pelo refinamento de suas maneiras e pelo bom gosto, que o ócio proporcionado pela renda da terra e pelas sinecuras lhes permitia cultivar. Os burgueses eram vistos como demasiado grosseiros, mesquinhos e individualistas para se dedicarem ao serviço público ou militar. Até o século XIX, e em muitos países até o início do século XX, os aristocratas tinham grande influência política e um papel destacado no governo e nas forças armadas, papel para os quais se supunha que eram hereditariamente qualificados.
Esses privilégios legais desapareceram à medida que caíam as monarquias, mas até em certos países republicanos continuaram a gozar de distinção social e ter reconhecido o título como uma propriedade imaterial, protegida pela lei do uso indevido por terceiros. Nos países que continuaram a ser monarquias, os privilégios diminuíram pouco a pouco, mas alguns ainda restavam no final do século XX e mesmo hoje.
Para a pequena nobreza, as coisas ficaram mais difíceis. O próprio conceito de nobre, (do latim nobilis, célebre, ilustre) antes sinônimo de “infanção” ou “fidalgo”, passou por uma mudança: à medida que expandiam o aparato estatal, os soberanos passaram a recrutar grande parte de seus funcionários entre plebeus livres, em geral mais preparados e leais. Para recompensá-los e dar-lhes condições de se impor legalmente e socialmente numa sociedade de estamentos hereditários, os mais importantes eram premiados com a concessão de foros de nobreza (não necessariamente títulos).
Os descendentes dos senhores medievais resistiram procurando distinguir-se por sua origem antiga e guerreira, surgindo então a distinção social entre “fidalgos” (filhos d’algo, quer dizer, com uma longa linhagem de antepassados ilustres), ou “nobreza de espada” (por serem supostamente descendentes de cavaleiros) e os meros “nobres”, plebeus nobilitados a partir da Idade Moderna e seus descendentes, dos quais a parte mais importante era a “nobreza de toga”, do aparato judiciário e administrativo real – prepostos (ou “prebostes”) e juízes.
A condição de “nobre”, embora continuasse privilegiada, foi precarizada ao longo da Idade Moderna. Eram isentos de impostos e trabalhos forçados, de penas infamantes (como o açoite, as galés, a tortura e o enforcamento) e de recrutamento como soldados de quartel. Tinham tratamento diferenciado nos tribunais e escolas e acesso preferencial ou exclusivo a posições militares, eclesiásticas, universitárias e de serviço ao rei, ou uma pensão se nada mais conseguissem. Mas à medida que isso começou a se tornar pesado e oneroso, o rei começava a exigir a comprovação da alegada nobreza – o que era frequentemente impossível, dada a falta de documentação escrita na Idade Média.
Além disso, a nobreza passou a ser perdida caso o portador se dedicasse a atividades plebeias como o trabalho manual e o comércio. Foi então que termos como “vilão” e “ignóbil”, inicialmente tinham apenas o sentido de “não nobre”, se tornaram fortemente pejorativas.
Embora todo filho legítimo de nobre fosse também nobre, havia também uma distinção entre eles pelo número de “costados” (quartering, em inglês), ou seja, de avós nobres. Um fidalgo de quatro costados é aquele cujos quatro avós foram nobres. Muitos cargos ou honrarias (incluindo, por exemplo, o direito de pertencer a certas ordens de cavalaria) exigiam que um fidalgo tivesse pelo menos dois, três ou quatro costados.
Ainda assim, a pequena nobreza permaneceu como uma classe distinta, associada à propriedade da terra e com acesso preferencial a certos cargos, notadamente o oficialato militar – daí a generalização do uso do termo “cadete”, antes referente aos filhos mais novos da nobreza, para os aspirantes a oficial militar. Isso durou na França até a Revolução, na Inglaterra, até o início do século XIX (na era vitoriana, já se podia chamar de “gentleman” a qualquer homem decente) e na maior parte da Europa Continental, até a I Guerra Mundial.
OS NOVOS SENTIDOS DOS TÍTULOS
Imperador
Até a Revolução Francesa, o título de imperador continuou a se aplicar no Ocidente apenas ao soberano do Sacro Império. Em 1508, seu título deixou de precisar de ratificação papal, mas sua supremacia sobre os príncipes do Império se tornasse pouco mais que nominal depois da Paz de Vestfália de 1648. No Oriente, foi adotado pelo Tsar da Rússia a partir de 1721 – embora seu título anterior já significasse “César”, não era reconhecido como imperial pelos outros soberanos europeus.
Em 1804, Napoleão se coroou imperador da França e dissolveu o Sacro Império, mas os soberanos da Áustria, que tinham sido os imperadores nominais há gerações, passaram a se intitular imperadores da Áustria. O título foi também adotado pelos soberanos do Brasil, ao se separarem de Portugal e (temporariamente) pelas monarquias revolucionárias do México e do Haiti.
Na França e nas monarquias americanas, o termo “imperador” ganhou a conotação de monarquia moderna, constitucional e liberal segundo o modelo de Napoleão (no Brasil, o título provavelmente também aludia ao antigo mito do “Quinto Império” português que um dia sucederia aos dos Assírios, Persas, Gregos e Romanos). Mas em outras partes do mundo, o título não perdeu completamente a pretensão de superioridade em relação aos reis. Assim, o Império da Áustria tratava o reino da Hungria como uma dependência até 1867. Ao unificar os reinos e principados alemães sob seu governo, o rei da Prússia passou a se intitular “Imperador (Kaiser) da Alemanha” e ao unificar os rajás e marajás indianos (equiparados a príncipes e reis) sob seu domínio, a rainha Vitória passou a intitular-se “Imperatriz da Índia”, título herdado por seus descendentes até a independência da Índia e Paquistão..
Rei
O conceito e o título de “Rei” sofreram uma profunda modificação a partir da França de Filipe II ou Filipe Augusto, início do século XIII. A partir de 1202, com o reconhecimento do Papa, a realeza se tornou formalmente hereditária e independente do Imperador, apesar de teoricamente vassala do papado. O título deixou de ser “rei dos francos” (chefe eleito de um povo) para ser “rei da França” (soberano hereditário de um país). Só então, também, o herdeiro passou a se tornar automaticamente rei com a morte do antecessor, passou a valer de direito a frase “rei morto, rei posto” e a coroação passou a ter apenas um papel simbólico.
A consagração e unção do rei (antes reservada ao imperador) pela Igreja passou a ter um sentido religioso. A cerimônia equiparava o rei a um sacerdote e o tornava “sagrado”, inclusive dando-lhe, ao menos aos olhos do povo francês, a capacidade milagrosa de curar com seu toque as escrófulas (gânglios inchados por tuberculose linfática). Sagrado, mas vale notar, não por “direito divino” e sim pela consagração da Igreja: aos olhos desta, a única autoridade por direito divino era a do Papa e as demais dependiam de seu reconhecimento e ratificação. A tese do “direito divino” dos reis, ou seja, que estes governam por direta delegação de Deus, surgiu na Idade Moderna entre os teóricos do absolutismo (primeiro na Inglaterra, depois na França), mas nunca foi aceita pelo Vaticano.
A hereditariedade e a sacralização deram à realeza uma aura mística e um prestígio que a colocaram muito acima dos senhores feudais, facilitando ao rei enquadrá-los e pouco a pouco impor sua autoridade sobre a maior parte do reino ou todo ele e deram origem a alguns novos títulos e noções de nobiliarquia.
Príncipe
O título de príncipe tomou nesse período vários outros sentidos, sem perder completamente o original. Conforme o país e o contexto, pode significar um título altíssimo – o herdeiro de um grande reino ou império – ou um título medíocre para nobres de média importância ou parentes distantes do soberano.
I. Príncipe (do Império): No Sacro Império Romano-Germânico, a partir do século XIII, o título de “príncipe” (Fürst, feminino Fürstin) antes associado apenas a pequenos Estados soberanos ou vassalos além das fronteiras imperiais, passou a ser concedido a todos os vassalos diretos do Imperador com assento na Dieta Imperial, cada vez mais soberanos na prática, como “príncipes do Império” (Reichsfürst).
Dentre estes, tinham precedência os príncipes-eleitores (Kurfürst), que escolhiam o sucessor, sistematizados como sete (três arcebispos, um rei, um duque, um marquês e um conde palatino) no século XIII.
Isso não suprimiu os títulos mais tradicionais: muitos príncipes do Império continuaram a ser condes, marqueses ou duques – e estes últimos sempre continuaram a preferir ser chamados pelo título tradicional, mais prestigioso que o título de “príncipe”, dos quais chegou a haver mais de 200. Dentre os príncipes condes, distinguiam-se Reichsgraf, “Conde Imperial”, vassalo direto do imperador desde a Idade Média; e Gefürsteter Graf “Conde feito Príncipe” ou “Conde Principesco”, que era a mesma coisa, mas com autonomia concedida em época mais recente. Os que geralmente usavam o título de “Fürst” (ou ainda usa, no caso do Liechteinstein) eram Burggraf, burgraves livres ou Freiherr (feminino Freifrau), barões livres.
II. Príncipe (honorário): Além desses príncipes, o Sacro Império conferiu honorariamente o título de Fürst aos chefes de outras famílias importantes, mas não detentoras de territórios diretamente vassalos do Imperador. O título também foi conferido pelo Papa a famílias aristocráticas que apoiavam o Vaticano e, na França, a algumas famílias nobres de média importância. Neste sentido, “príncipe” é um título inferior em prestígio ao de “duque”.
Além disso, quando Napoleão dissolveu o Sacro Império, “mediatizou” a maior parte dos pequenos principados, submetendo-os a Estados de maior porte – o que, numa época em que as instituições feudais já tinham desaparecido, significou reduzir seus príncipes do Império a meros proprietários slotscliftourteetry.com de terras e príncipes honorários.
III. Príncipe (herdeiro): Em 1301 (início da Renascença), o rei Eduardo I da Inglaterra, que conquistara o principado de Gales no final do século anterior, conferiu o título ao próprio herdeiro, como forma de distingui-lo e de combater as pretensões de nobres galeses. Além disso, deu a outros filhos seus o título de “duques”, dando-lhes precedência sobre todos os demais aristocratas ingleses. Estes eram, no máximo, condes, pois não havia, na Inglaterra, marquesados ou ducados tradicionais. Toda a família real, não apenas o rei, passava a ser colocada num patamar superior.
Na França, viu-se uma evolução paralela por razões um tanto diferentes. O rei comprou em 1349 o antigo condado de Viennois, situado no Sacro Império, também chamado “o Delfinado” porque seu senhor era conhecido, desde o século XIII como “o Delfim”, por ter esse animal no brasão. O acordo com o imperador exigiu, porém, que o novo território continuasse vassalo do Império e legalmente separado da França, sendo sempre posse do herdeiro e não do próprio rei. O herdeiro da coroa francesa passou a ter o título de Delfim do Viennois (e sua esposa de Delfina), mesmo se em1461 a região foi definitivamente anexada à França.
Ao longo do século XIV, o rei de Castela passou a dar a seu herdeiro o título de Príncipe das Astúrias, o de Aragão o de Duque de Girona e o da Escócia, de Duque de Rothesay. No século XIV, o herdeiro de Navarra passou a ser Príncipe de Viana, o de Aragão, Príncipe de Girona. Em Portugal o herdeiro passou a chamar-se simplesmente “Príncipe Herdeiro” até o século XVII, quando passou a ser “Príncipe do Brasil” ou “Princesa da Beira”. No século XVIII, passou a ser Príncipe ou Princesa do Brasil e Príncipe ou Princesa da Beira passou a ser o título do segundo na linha de sucessão. A Holanda também veio a adotar o título de Príncipe de Orange para seus herdeiros, a Itália, de Príncipe de Nápoles e Piemonte, a Bélgica, o de Duque de Brabante, a Suécia, de Duque de Escânia. O herdeiro do Brasil chamou-se “Príncipe Imperial” e o segundo na linha da sucessão, “Príncipe do Grão-Pará”. O do Império Alemão era “Príncipe Herdeiro” (Kronprinz), o dos reinos alemães, “príncipes hereditários” (Erbprinz). Por analogia, os Imperadores do Sacro Império Romano passaram, a partir de1508, a intitular seus herdeiros de “Rei dos Romanos”, um passo abaixo do título de Imperador. O Imperador Napoleão I deu o mesmo título a seu herdeiro, enquanto esteve no poder.
Na Península Ibérica, os demais filhos dos reis e do príncipe continuaram a ser infantes e infantas, como na França eram enfants (fils ou filles) de France os filhos do rei e do delfim. Na França, surgiu também, no século XVII, o título de “pequeno infante” (petit-enfant) para os filhos e filhas de infantes que não o delfim.
IV. Príncipe (de sangue): No século XVI, todos os descendentes de reis franceses por linha masculina (e que, portanto, podiam se tornar herdeiros ou ancestrais de herdeiros caso o rei ou o delfim não tivessem filhos) que não fossem filhos do Rei ou do Delfim foram equiparados aos pares do reino e chamados “príncipes de sangue”, sendo o irmão do rei o “primeiro príncipe de sangue”, embora geralmente também fossem duques ou tivessem outros títulos. Os filhos bastardos do rei que fossem reconhecidos eram “príncipes legitimados”.
Esse é um quarto significado da palavra “príncipe”, que nesse contexto Per apprendere come giocare al tavolo da blackjack online massimizzando le possibilita di vincita e minimizzando le perdite avrai bisogno di seguire alcune regole che possiamo chiamare strategia di base. é inferior ao de “infante” e “pequeno infante” (ao contrário do que se dava em Portugal), mas superior aos demais nobres titulados.
Esse sentido foi adotado de maneira ainda mais ampla na Rússia a partir do século XVIII: todos os descendentes, mesmo distantes, da família imperial tiveram o direito a serem chamados de “príncipe” (kniaz) e o título foi também concedido especialmente a certas famílias, elevando o número de príncipes russos a mais de dois mil. Enquanto isso, os irmãos, filhos e demais descendentes diretos do czar reinante eram distinguidos com o título de grão-príncipe ou velikiy knyaz, título também traduzido como “grão-duque”, enquanto o herdeiro era o Tsesarevich (feminino Tsesarevna), literalmente “filho do César (imperador)”.
Na Alemanha, os filhos e filhas de príncipes (Fürst), vieram a ser chamados príncipes de sangue, mas por uma palavra diferente em alemão (Prinz, feminino Prinzessin). Na Itália, ambos os títulos permaneceram confundidos.
No século XVIII, o título de “príncipe” e “princesa” foi adotado na Grã-Bretanha para todos os filhos e filhas do rei e dos príncipes homens (embora só o herdeiro fosse “Príncipe de Gales”), mas a prática não foi generalizada para outros países. No Império Austríaco depois de 1804, de forma análoga, o título de “arquiduque” e “arquiduquesa” passou a ser usado por todos os membros da casa imperial, mas só o herdeiro era “Arquiduque da Áustria”.
Arquiduque foi um título adotado pelos duques austríacos em 1406, após controlarem vários ducados, tornarem-se uns dos senhores mais poderosos dentro do Sacro Império e passarem a disputar o direito a ser um dos príncipes eleitores. O título só foi reconhecido quando os próprios duques da Áustria se tornaram imperadores.
Grão-duque foi um título inicialmente reivindicado (sem ser reconhecido) pelo duque de Borgonha, que era o mais poderoso da Europa Ocidental na Baixa Idade Média, controlava vários ducados e aspirava a se tornar um rei soberano. Para reforçar sua pretensão, criou todo um complexo sistema de protocolo, títulos e honrarias que acabaram sendo imitadas pelas cortes reais europeias, mas o ducado foi extinto antes que conseguisse realizar seu projeto.
Foi já na Idade Moderna (1569) que o duque de Florença Cosimo I de Médici conseguiu ser elevado oficialmente pelo papa a grão-duque da Toscana. Embora fosse esta ainda fosse teoricamente vassala do Imperador, havia se tornado, de fato, um grande principado mais rico e independente do que a maioria dos ducados alemães.
Não houve outros títulos de grão-duque até que Napoleão I dissolveu o Sacro Império e conferiu o título a alguns dos antigos duques do Império. Alguns desses títulos foram confirmados e outros criados no Congresso de Viena ou algum tempo depois, resultando em uma dezena de grãos-ducados dos quais hoje só resta um, o Luxemburgo. Eram ducados de médio porte, intermediários entre os maiores ducados, que se tornaram “reinos” e os menores, que permaneceram meros “ducados”.
Pares do Reino e Grandes do Reino
O conceito de par do reino surgiu da centralização monárquica. Dentre o número muito multiplicado de condes, marqueses e duques, o rei começou a qualificar os mais poderosos entre seus aliados como “pares”, o que os colocava em posição teoricamente igual entre si, imediatamente inferior à família real e superior a todos os demais senhores, fossem quais fossem seus títulos. Isso também lhes trazia o direito a participar dos conselhos superiores do reino e privilégios simbólicos, como tratamento diferenciado na corte. Foi uma evolução paralela à dos príncipes alemães, mas sem que se conservasse a soberania. Na França a lista inicial era de 12 – 6 duques e condes e 6 arcebispos e bispos. Às vésperas da Revolução, havia 49 pares: 5 príncipes de sangue, 1 príncipe legitimado, 7 membros do alto clero e 36 duques (havia ainda 15 duques hereditários que não eram pares e 16 duques não hereditários).
Na Espanha e em Portugal, usou-se a qualificação semelhante de grande do reino, que incluía, entre seus privilégios, o de usar o título de “Vossa Excelência” (e não simples “Vossa Senhoria”), sentar-se em presença do soberano, dançar com as princesas e serem chamados pelo rei de “primos”. Na Espanha, mantiveram alguns privilégios legais até o final do século XX. Dos cerca de 500 nobres titulados da Espanha no século XVIII, só 100 tinham “grandeza”. Em Portugal, eram cerca de 50 famílias com “grandeza”.
Em Portugal, durante a monarquia constitucional (1826-1910), existiu uma Câmara dos Pares do Reino com até 100 membros hereditários. Ser Par do Reino dava direito às honras de conde, mesmo que se fosse visconde ou barão. Na primeira leva, foram nomeados todos os grandes do reino, os duques, os marqueses, a quase totalidade dos condes e dois viscondes com grandeza.
No Brasil Imperial, todos os condes, marqueses e duques eram automaticamente “grandes do reino”, mas apenas alguns dos barões e viscondes tinham “grandeza”.
Lordes e Ladies
Na Inglaterra, a condição de par do reino (pertencer à peerage) foi atribuída automaticamente a todos os portadores de títulos de nobreza, de barão a duque. Até 1999 isso conferia direito automático a assento hereditário na Câmara dos Lordes, com funções de Senado e (até 2009) de Supremo Tribunal. Portanto, no Reino Unido, as noções de “par do reino”, “membro da alta nobreza” (nobility), “lorde” e “portador de título de nobreza” coincidem, o que não acontecia em outras monarquias. Os termos ingleses noble e nobleman são “falsos amigos”: não correspondem ao sentido mais geral de “nobre” em português e outras. A pequena nobreza é chamada, em inglês, de gentry e assim como os filhos dos pares, são legalmente commoners ou “comuns”, tanto quanto os plebeus.
Ser um Lorde significa, portanto, ser um portador de um título de nobreza hereditário do Reino Unido, ou ser a ele equiparado, como é o caso dos “lordes espirituais” (bispos e arcebispos) e a partir de 1876, os “pares vitalícios”, plebeus ou membros da pequena nobreza que recebem um título não-hereditário (quase sempre de barão) que lhes dá assento na Câmara dos Lordes. Com as reformas recentes, passaram a ser a maioria de seus integrantes.
Por cortesia, são também chamados de “Lordes” e “Ladies”, na Inglaterra, os filhos de duques e marqueses e os primogênitos de condes, mas sem direito a assento na Câmara nem ao estatuto de nobility. Por exemplo, a Lord Randolph Churchill, pai de Winston Churchill, por ser terceiro filho de um duque. Filhas de condes também são chamadas Ladies – era o caso, por exemplo de Lady Diana Spencer, antes de se casar (era filha de um Conde Spencer). O mesmo se aplica aos detentores de certos altos cargos, principalmente os chefes dos ministérios mais tradicionais e os prefeitos das grandes cidades (Lord Mayor). Este último caso é um dos raríssimos casos em que o título é aplicado a mulheres – outro é o título tradicional de Lord of Mann (Senhor da ilha de Mann).
Em qualquer outra situação, uma mulher que detenha a posição de um Lorde é Lady, assim como a esposa de um Lorde (mesmo que de origem plebeia). No uso moderno, também as esposas de baronetes e cavaleiros são chamadas Ladies, mas no passado (e ainda no presente, em certos usos formais), eram Dames.
É importante notar que o título de Lorde é usado com o sobrenome ou com o nome completo, mas nunca só com o prenome. Assim, o poeta George Byron, que era um barão, podia ser chamado de Lorde Byron ou Lorde George Byron ou, no tratamento mais formal, “George Gordon Byron, 6º Barão Byron”, mas jamais “Lorde George” (quem ver ou ouvir essa expressão de um britânico, pode ter certeza que George é o sobrenome).
O uso de Lady é similar, mas com três ressalvas: 1) com princesas e mulheres da família real, pode ser usado só com o prenome (por exemplo, “Lady Diana”); 2) com esposas de cavaleiros e baronetes, só é usado com o sobrenome (por exemplo, “Lady Smith”) e 3) quando é usado por damas das ordens da Jarreteira e do Cardo que a detêm por direito próprio e não pelo marido, só é usado com o nome completo (“Lady Marion Fraser, LT”, quer dizer, Lady of the Thistle).
Embora haja tratamentos mais cerimoniosos, pode-se usar “My Lord” e “My Lady” ou “Your Lordship” e “Your Ladyship” ( “Vossa Senhoria”) e, na terceira pessoa, “His Lordship” e “Her Ladyship” (“Sua Senhoria”) ao se dirigir a barões, viscondes, condes e marqueses, mas não duques e duquesas: estes, só admitem “Your Grace” (“Vossa Graça”, correspondente ao português “Vossa Mercê”). É ainda mais descortês, naturalmente, usar “My Lord” para um príncipe ou rei, ou “My Lady” para uma princesa ou rainha. É preciso usar “Vossa Alteza Real” ou “Vossa Majestade”.
No uso formal (documentos e endereçamento de cartas, por exemplo), só se usa “O Lorde Fulano” para barões. Se for visconde, “O Visconde Fulano”. Ou, para ser mais formal, “The Right Honourable, The Lord/Viscount Fulano” (em tradução livre, “O Ilustríssimo Senhor/Visconde Fulano”).
Se for conde, “O Conde de X” (não o sobrenome, mas o nome do condado) ou, melhor ainda, “The Right Honourable Earl of X”. Se for marquês, “O Marquês de X” ou “The Most Honourable Marquess of X”. Se for duque, “O Duque de X” ou “Sua Graça, o Duque de X”.
Tudo isto, naturalmente, só se aplica ao Império Britânico ou a cenários de fantasia baseados na Inglaterra, como é o caso, naturalmente, da maioria dos mundos de Alta Fantasia criados por autores de língua inglesa. Mas o uso de termos como Lorde, Lady e Sir pressupõe que esse é o caso – e então essas regras devem ser levadas em conta.
Outros tratamentos de cortesia
No uso inglês, por se imitar o rei ou rainha ao conceder o título de “Príncipe de Gales”, é comum que um conde, marquês ou duque, conceda a seu herdeiro aparente (e até ao herdeiro aparente deste) o uso social de um título inferior que também possua – e frequentemente possui, pois a maioria das grandes linhagens, a partir da Idade Moderna, concentrou vários antigos feudos na mesma herança.
Por exemplo, o Duque de Norfolk é também Conde de Arundel e Barão Maltravers. Então, reserva o uso social de “Duque de Norfolk” para si mesmo, cede o uso do título de “Conde de Arundel” para o herdeiro e o de “Barão Maltravers” para o herdeiro deste, seu neto. Entretanto, só o próprio Duque é legalmente um lorde e tem assento na Câmara dos Lordes.
Não é o uso para viscondes e barões que, aliás, não costumam ter títulos “sobrando”, mas seus herdeiros têm direito legal ao prefixo de cortesia “The Honourable”, mais ou menos correspondente ao português “Ilustre Senhor”, enquanto os viscondes e barões propriamente ditos são “The Most Honourable”, “Ilustríssimo Senhor”. Outrora se usava também o título de “Sir” para o filho de um baronete, mas essa prática foi abandonada.
Isso não se aplica necessariamente a outros países, mas na França, a partir da Restauração (1817), determinou-se que qualquer filho de um nobre titular que fosse Par do Reino (inclusive os cadetes) podia usar um título um grau inferior ao do pai (e o filho de um barão, o título de cavaleiro). A lei caiu com o fim do pariato hereditário em 1831, mas a prática continuou e se generalizou na aristocracia francesa.
Na Escócia, o herdeiro de um título feudal é “Mestre” (“Master” ou “Mistress”) do senhorio do detentor atual: por exemplo, o herdeiro do Marquês de Tweeddale é Mestre de Tweeddale.
Na Itália, nobiluomo (aproximadamente Gentil-homem) ou nobile é o título dos filhos de um nobre titulado desde 1870 (antes, eram chamados cavalieri. cavaleiros). Os filhos do Conde de Segni, por exemplo, são os “nobres do Conde de Segni”. Além disso, os filhos de príncipes usam os títulos de don ou donna.
No Brasil e em Portugal, não houve títulos específicos para os filhos de um nobre titulado, mas se o pai herdou o título de Dom, seus filhos também podem usá-lo. E se for o pai o primeiro da linhagem a usar o “Dom”, só o filho mais velho pode usá-lo.
Dom e Dona são, no contexto luso-brasileiro, tratamentos comparáveis a Lord e Lady (vêm de Dominus, equivalente a Lord), mas não são exatamente equivalentes. Em Portugal, esses tratamentos eram originalmente destinados apenas à família real (dos próprios soberanos a seus descendentes mais distantes), ou a outros membros da alta nobreza que fossem especialmente distinguidos pelo rei com o direito a usá-los, tendo ou não títulos.
Ao contrário do Lord/Lady inglês, os títulos de Dom/Dona são usados com o primeiro nome ou com o nome completo: Dom Vasco ou Dom Vasco da Gama, mas não Dom da Gama.
Nos antigos romances em línguas ibéricas, os cavaleiros da Távola Redonda são chamados “Dom Lançarote” (Sir Lancelot), “Dom Galvão” (Sir Gawain) e assim por diante. Em inglês não são chamados Lordes, pois não se supunha que fossem grandes senhores titulados, nem que fossem conhecidos pelos nomes de família ou de seus feudos. Mas serem “Dons” era adequado em Portugal, onde esse tratamento podia ser dado ao rei a seus servidores notáveis independentemente de outros títulos (por exemplo, Vasco da Gama ganhou o direito a se chamar Dom Vasco antes de ser agraciado com o título de Conde da Vidigueira). Mas claro que a maioria dos cavaleiros era apenas “Senhor Fulano”, ou “Senhor Cavaleiro”. Quando o senhor Alonso Quijano, um pequeno fidalgo rural, se intitulou “Dom Quixote”, usurpava um título a que não tinha direito para imitar os romances de cavalaria.
A partir das Ordenações Filipinas de 1611, o uso foi generalizado em Portugal, como se fazia na Espanha, a todos os condes, marqueses e duques, aos barões e viscondes “com grandeza”, aos grãos-mestres das ordens de cavalaria, aos membros do alto clero (bispos, arcebispos e cardeais, que ainda hoje o usam) e aos generais e almirantes.
Em português, o título de “Dom” continua a ser raro – no Brasil, é usado apenas para os príncipes da família imperial, bispos, abades e monges de certas ordens, mas “dona” se aplica a qualquer mulher respeitável (como, aliás, também lady em inglês). Em algumas línguas latinas, como o castelhano, “don” é também usado para qualquer homem de respeito. A distinção entre o uso popular e o tradicional é marcada pela inicial minúscula ou maiúscula.
Vale notar que muitos autores de fantasia tendem intuitivamente a usar os títulos de “Lord” e “Lady” de acordo mais com o uso português de Dom e Dona do que com o uso britânico correto. Destaquemos, então, as diferenças:
– O título de Dom ou Dona (como os títulos britânicos de Sir e Dame) se usa com o primeiro nome ou nome completo; os de Lorde e Lady, com o sobrenome, nome completo ou (no caso de condes, marqueses e duques) nome da senhoria.
– O título de Dom ou Dona se aplica a soberanos e herdeiros (Dom Pedro II, Dona Isabel); o título de Lorde ou Lady nunca (não se diz Lady Elizabeth II, nem Lord Charles).
– O título de Dom ou Dona pode ser usado por pessoas que não têm títulos de nobreza, desde que tenham parentesco com a família real ou sejam especialmente honradas (Dom Vasco, Dom Galvão); o título de Lorde ou Lady só é usado por nobres titulados.
Brasil
No Brasil imperial, os títulos eram concedidos em caráter não-hereditário, como recompensa a mérito real ou suposto e não significavam fidalguia no sentido europeu do termo. A “grandeza” era concedida automaticamente a portadores de títulos de conde, marquês ou duque, mas só a alguns barões e viscondes, que podiam ser “com grandeza” ou “sem grandeza”. O tratamento para o portador de um título “com grandeza” (que não fosse da família imperial) era de Vossa Excelência ao se dirigir diretamente ao agraciado (“Farei como Vossa Excelência quiser”) e Sua Excelência quando referido a terceiros (“Leva este documento a Sua Excelência”). Para um título “sem grandeza”, era de Vossa Senhoria e Sua Senhoria.
Esses tratamentos eram proibidos aos não titulados, sob pena de multa e só foram aplicados a cidadãos respeitáveis em geral a partir da Proclamação da República. Hoje, “Vossa Excelência” se aplica a presidente, ministros, parlamentares, governadores, secretários de Estado, prefeitos, generais, juízes, embaixadores, cônsules, mestres e doutores; e “Vossa Senhoria” a qualquer oficial militar ou funcionário público graduado, professor ou particular respeitável (em cartas comerciais tradicionais, por exemplo). No endereçamento, os tratamentos correspondentes são “Excelentíssimo senhor” e “Ilustríssimo senhor” (exceto juízes, que são “Meritíssimo senhor”). No uso moderno, admite-seem português “Vossa Graça” (imitação do inglês) ou “Vossa Excelência” para qualquer nobre titulado.
Embora fosse necessário pagar uma taxa substancial pela “carta de mercê” para os títulos e brasões, eles não eram realmente “comprados” – o Imperador os concedia por critérios políticos e nem todos os chefes de famílias ricas ou politicamente influentes os conseguiam, ainda que os implorassem. Foram distribuídos (principalmente o título de barão) mais generosamente nos últimos anos do Império, para buscar apoio dos latifundiários e compensá-los pela perda dos escravos.
Tudo isso só é obrigatório ao se dirigir a essas pessoas pela primeira vez: na continuação de uma conversa, pode-se usar “sir” ou “ma’am” (correspondentes a “o senhor” ou “a senhora”). Em português, pode-se usar “a senhora duquesa” ou “minha senhora duquesa”, “o senhor conde” ou “meu senhor conde”e assim por diante.
É correto, porém, usar pronomes retos, possessivos e oblíquos ao se falar com um rei ou príncipe – não é preciso usar sempre “a vossa majestade” ou “de sua majestade”. Vale notar que, do ponto de vista estritamente gramatical, tratamentos como “Vossa Majestade” e “Vossa Mercê” são femininos e em terceira pessoa, mas na prática, costumavam ser usados (pela figura chamada silepse) de acordo com o gênero natural do sujeito e na segunda pessoa.
Assim, ao se dirigir a um imperador, seria gramaticalmente mais correto dizer:
“Acompanhou esta Câmara o discurso que o Ministério acaba de proferir pelos augustos lábios de Vossa Majestade; e, escutando-a com a reverência devida à sua posição…”
Mas no uso efetivo, se diria o seguinte:
“Acompanhou esta Câmara o discurso que o Ministério acaba de proferir pelos augustos lábios de Vossa Majestade; e, escutando-o com a reverência devida à vossa posição…” (como de fato discursou Rui Barbosa para D. Pedro II, em 4 de maio de 1889).
A CAVALARIA
Apesar do que frequentemente se pensa e pode ser encontrado na Wikipédia, o cavaleiro não é a “casta mais baixa da nobreza”. Em geral não era um título hereditário, nem sempre pertenciam à camada inferior da nobreza e mesmo onde se tornou título hereditário, não é o menos importante deles. Embora a ideologia medieval se baseasse na divisão da sociedade entre laboratores (plebeus trabalhadores), bellatores (nobres guerreiros) e oratores (clero) e os cavaleiros fossem os guerreiros medievais por excelência, houve também cavaleiros plebeus e clericais. Por outro lado, alguns cavaleiros eram filhos da alta nobreza que, por serem cadetes (não primogênitos), não herdavam terras ou títulos.
A cavalaria medieval, tal como se instituiu a partir do império de Carlos Magno, era formada fundamentalmente por membros da pequena nobreza, que podiam herdar uma propriedade como vassalos de um senhor feudal ou serem fidalgos sem terra que se punham diretamente a seu serviço, podendo ou não receber uma propriedade por seu serviço. Salvo exceções, o filho de um cavaleiro não tinha automaticamente o título de cavaleiro: precisava fazer jus a ele depois de servir como pajem (dependendo do lugar e da época, “donzel” , “moço de câmara” ou “valete”) e, depois, como escudeiro. Idealmente, o candidato a cavaleiro iniciava seu treinamento servindo como pajem aos sete anos, aos 14 anos tornava-se escudeiro e passava a acompanhar o cavaleiro em batalha e torneios, cuidando de suas armas e cavalos, e aos 21 anos era armado cavaleiro. Mas há casos de cavaleiros armados aos 10 ou 11 anos de idade, ou depois dos 21 e muitos escudeiros que jamais se tornaram cavaleiros, porque assumiam funções não militares e suas famílias preferiram evitar as despesas da cerimônia.
Os cavaleiros formavam a espinha dorsal dos exércitos medievais e detinham privilégios especiais. Na Inglaterra, questões legais envolvendo propriedade de terras tinham de ser decididas por um júri formado de cavaleiros e alguns deles eram comissionados para manter a “paz do rei”, julgando e punindo quem a ameaçasse. De início, era uma instituição bastante brutal – foi só na Baixa Idade Média que o ideal do “cavalheirismo” começou a se difundir.
Na Baixa Idade Média surgiram também cavaleiros plebeus, chamados em Portugal (de maneira estranha a ouvidos modernos) “cavaleiros-vilãos”. Com a multiplicação e crescimento de vilas e cidades, estas tiveram a necessidade de se defender e a obrigação de prover tropas a seus suseranos – principalmente peões (lanceiros a pé), mas também alguns cavaleiros, mercadores ou “homens bons” (proprietários) com recursos suficientes para possuir um cavalo e o resto do equipamento. Recebiam, assim, parte dos privilégios da nobreza, mantidos depois de sua reforma, aos 60 anos. Mais raramente, soldados mercenários de origem camponesa também acabavam por reunir meios suficientes para lutar como cavaleiros.
Também nesse período, surgiram os frades ou monges guerreiros de ordens religiosas de cavalaria. Eram sempre de origem ao menos parcialmente fidalga e geralmente não tinham formação religiosa especial e nem mesmo sabiam ler ou escrever, mas se tornavam membros do clero ao fazer votos de castidade, pobreza e obediência para lutarem nome da Cristandade contra os muçulmanos na Palestina (como os Templários e os Cavaleiros de Malta) ou na Península Ibérica (como a Ordem de Avis), ou contra os pagãos da Europa Oriental (como os cavaleiros teutônicos). Tinham às suas ordens peões e sargentos plebeus e também freiras e clérigos propriamente ditos, que cuidavam de seus hospitais, registros e burocracia. Subordinadas apenas ao Papa, financeira e militarmente poderosas e às vezes controlando territórios importantes, chegaram a ser mais ricas e poderosas que muitos reinos.
Na Idade Moderna, a cavalaria feudal tradicional perdeu importância militar. Os reis passaram a monopolizar o privilégio de armar cavaleiros e começaram a criar ordens seculares de cavalaria com uma organização, hierarquia e símbolos análogos ao das ordens religiosas, mas com fins puramente simbólicos. Salvo pela Ordem Teutônica, que se converteu ao luteranismo e tornou-se o Ducado (depois Reino) da Prússia, as ordens religiosas de cavalaria foram aniquiladas (como os Templários), desmilitarizadas e tornadas puramente caritativas (como os Cavaleiros de Malta), ou passaram ao controle dos reis (como a ordem de Avis) e acabaram por ser secularizadas e tornarem-se também simbólicas e honoríficas.
Na maioria dos casos, o título de cavaleiro passou a ser uma honraria não-hereditária concedida a quem prestasse serviços destacados à coroa ou ao país, civis ou militares. Seu valor real depende tanto da ordem ao qual é ligado (há ordens mais ou menos prestigiosas, vinculadas a diferentes tipos de realizações e serviços) quanto ao grau conferido dentro da ordem. Embora algumas ordens fossem reservadas, ao menos em certas épocas, a fidalgos, outras foram abertas a plebeus. Eventualmente, continuaram a existir (ou foram criadas) em regimes republicanos, perdendo qualquer vínculo com a noção de nobreza hereditária.
No Reino Unido, o título de “cavaleiro” (knight, feminino lady ou dame, conforme o caso), tem hoje um grande prestígio equivalente às mais altas condecorações de outros países. As mais elevadas ordens britânicas têm apenas um grau, Knight (cavaleiro) ou Lady (grande dama). As de média importância têm graus de Knight/Dame grand cross (Cavaleiro/Dama da grã-cruz) Knight/Dame commander (Cavaleiro/dama comandante) e Companion (Companheiro). As ordens mais numerosas e menos importantes têm cinco graus: Knight grand cross, Knight commander, Commander, Officer e Member.
Na Inglaterra, um cavaleiro tem o direito a ser chamado Sir se for homem e Dame, se for mulher (Lady nas ordens mais importantes – a da Jarreteira e do Cardo), equivalentes a “senhor” e “senhora”. É importante notar que um Fulano de Tal armado cavaleiro britânico é chamado Sir Fulano ou Sir Fulano de Tal, jamais Sir de Tal. Assim, o famoso corsário podia ser chamado Sir Francis ou Sir Francis Drake, mas nunca Sir Drake.
No endereçamento, um cavaleiro britânico acrescenta a abreviação do exato título e nome de suas ordens, pois isso define sua verdadeira importância – por exemplo, Sir Eric Anderson, KT (Knight of the Order of the Thistle – Cavaleiro da Ordem do Cardo) tem um título muito mais prestigioso que Sir Reginald Bacon, KCB (Knight Commander of the Order of the Bath – Cavaleiro Comandante da Ordem do Banho) e ambos são mais importantes que um mero Cavaleiro Comandante da popular Ordem do Império Britânico (KBE).
No passado, o título britânico de “cavaleiro” foi visto como a porta de entrada para a gentry ou pequena nobreza e mesmo não sendo hereditário, permitia a seus descendentes primogênitos usarem o título de “escudeiro” ou esquire. Hoje, essa distinção perdeu o sentido.
Já no Brasil e Portugal, como em muitos outros países, a maioria das ordens honoríficas tem cinco graus: Grã-cruz, Grande Oficial, Comendador, Oficial e Cavaleiro, seguindo o modelo da França (Legião de Honra): Grand Croix, Grand Officier, Commandeur, Officier e Chevalier. Os equivalentes aproximados do cavaleiro ou sir britânico seriam, portanto, os dois graus mais altos dessas ordens, grã-cruz e grande oficial. Neste modelo, ser “cavaleiro” significa apenas ter recebido uma condecoração no grau mais baixo Ainda assim, Silvio Berlusconi costuma ser chamado pelos admiradores e por sua imprensa Il Cavaliere, por uma condecoração da Ordine al Merito del Lavoro, equivalente à nossa obscura Ordem do Mérito do Trabalho.
Cavaleiro-abandeirado (Knight banneret, ou Banneret, em inglês) era um cavaleiro “sênior” com cavaleiros-bacharéis sob seu comando, distinguido por uma bandeirola retangular (os subordinados usavam um pendão triangular). Em alguns países, tornou-se uma honraria superior à de cavaleiro, às vezes hereditária. No Reino Unido, foi substituído pelo título de knight commander, conferido (no mínimo) a todos os cavaleiros que pertencem a ordens de cavalaria.
Cavaleiro-bacharel (knight bachelor, em inglês) era originalmente o jovem cavaleiro que combatia sob as ordens de um banneret, um cavaleiro de patente superior. Atualmente, é no Reino Unido alguém que é armado cavaleiro independentemente de uma ordem de cavalaria, o que o coloca em grau inferior a todos os demais cavaleiros. Essa honraria é conferida automaticamente aos detentores de certos cargos públicos inclusive, por exemplo, juízes de tribunais superiores e o chefe da polícia de Londres, a Scotland Yard (o que lhes garante serem tratados como Sir). Também tem sido conferida a figuras do esporte e do show business. No lugar da abreviatura do nome da ordem, usa apenas Kt. (Knight), a menos que tenha também mais outra honraria, mesmo que não seja em grau de cavaleiro – por exemplo, Sir Paul McCartney, MBE (Member of the Order of the British Empire, ou seja, simples membro da Ordem do Império Britânico, a mais numerosa e menos prestigiosa do Reino Unido).
Cavaleiro novel era um cavaleiro que ainda não tinha conquistado sua primeira vitória e por isso, segundo o costume da Baixa Idade Média, ainda não tinha direito a pintar um brasão em seu escudo.
Comendador (em inglês, Commander, em francês Commandeur) era originalmente o cavaleiro de uma ordem religiosa que detinha um comando ou “Comenda”, quer dizer, uma guarnição de cavaleiros e as propriedades rurais que a sustentavam. Atualmente, é uma condecoração de valor superior à de simples cavaleiro, ocasionalmente citada na vida social no Brasil e outros países.
Companheiro (Companion, em inglês) é um título britânico de pessoas que pertencem a ordens de cavalaria tradicionais, mas apenas como “companheiros” dos cavaleiros e damas propriamente ditos. Equivale aproximadamente a um “comendador” brasileiro ou português, no uso moderno da palavra. Pode usar a abreviatura da ordem depois do nome, mas não tem direito a se fazer chamar de Sir ou Dame.
Cavaleiro da espora dourada é uma expressão espanhola para o cavaleiro fidalgo, que tinha o direito a essa distinção em relação àqueles que se tornavam nobres apenas ao serem armados cavaleiros.
Cavaleiro vilão é o cavaleiro plebeu, geralmente recrutado da burguesia urbana. Na Espanha era chamado cavaleiro pardo, porque não tinha o direito a usar as roupas coloridas reservadas à nobreza.
Baronete (em inglês, baronet), feminino Baronetesa (baronetess) é um título hereditário que só existe no Reino Unido, criado no século XVII para ser vendido como forma de arrecadar fundos da pequena nobreza. É chamado Sir ou Dame com as mesmas regras que se aplicam aos cavaleiros (e pode acrescentar, na correspondência, a abreviação “Bt.” – por exemplo, Sir Mark Thatcher, Bt.). Em termos de protocolo, um baronete está logo abaixo dos filhos cadetes dos barões e tem precedência sobre a maioria dos cavaleiros – exceto os das Ordens da Jarreteira (inglesa) e do Cardo (escocesa), as mais prestigiosas do Reino Unido. Embora o título seja hereditário, seu portador não é considerado um lorde ou par do reino e não tem assento na Câmara dos Lordes. Outrora, o filho mais velho de um baronete tinha direito automático ao título de cavaleiro, mas esse privilégio foi abolido em 1827.
Cavaleiro hereditário é o fidalgo com direito hereditário ao título de cavaleiro. No Reino Unido, há apenas duas linhagens vivas de cavaleiros hereditários, mas na Alemanha o título de Ritter tornou-se hereditário, como o equivalente Ridder na Holanda e Cavalieri na Itália, como um título superior ao de Edler ou Nobile mas inferior ao de Freiherr ou Signore. Vale notar que, em geral, não são descendentes de verdadeiros cavaleiros medievais e sim de filhos cadetes de nobres titulados ou de pequenos senhores agraciados com títulos hereditários de cavaleiro.
Cavaleiro imperial ou Cavaleiro livre (em alemão, Reichsritter) é um título paradoxal que surgiu da caótica desintegração do Sacro Império Romano-Germânico: cavaleiros que detinham pequenos feudos, com algumas centenas de súditos, mas não respondiam a nenhum suserano além do próprio Imperador – o que os tornava senhores de miniestados praticamente independentes, embora sem representação na Dieta (parlamento).
OUTROS TÍTULOS
Patrício foi, principalmente, no norte da Itália (mas com equivalentes na Holanda e Alemanha) o integrante de uma forma de nobreza urbana, característica de cidades-estado. Como na Roma antiga, eram geralmente integrantes de famílias antigas e poderosas dentre as quais eram escolhidos os principais cargos públicos, como o Doge de Veneza. Eram mais importantes que a simples fidalguia ou “nobreza cívica”, mesmo que não tivessem outros títulos. Além disso, na Idade Média e Moderna, “patrício romano” tornou-se um título distribuído pelo Papa a todas as famílias que deseja distinguir.
Alguém que é patrício é chamado pelo nome da cidade e não de uma família ou residência específica: “Fulano de Tal, Patrício de Veneza”, por exemplo. Para uma mulher, usa-se “Fulana, dos Patrícios de Tal”.
Cossenhor – embora a regra geral, quanto às propriedades feudais e senhoriais, fosse a herança na íntegra de pai para filho primogênito, havia regiões (sul da França e parte da Itália) em que o costume admitia ou exigia que os irmãos herdassem o feudo em conjunto, sem dividi-lo. Nesse caso, cada um deles se tornava um cossenhor.
Senhor é um fidalgo senhor de uma propriedade (geralmente rural) significativa, com um solar ou casa senhorial, que não tivesse um título mais alto, como os Senhores de Pombeiro, em Portugal. Faziam jus, como os nobres titulados, a serem chamados “Vossa Senhoria”.
Edler (feminino Edle) significa, ao pé da letra, “mais nobre” e é o equivalente alemão – Viktor Weber Edler von Webenau, por exemplo, poderia ser traduzido como Viktor Weber, Senhor de Webenau. É tratado como Herr Edler.
Laird (feminino Lady) é um fidalgo escocês que é herdeiro de uma propriedade de caráter feudal, passada de pai para filho primogênito. Um laird chamado Richard Lauder, cuja propriedade se chame Haltoun, será tratado como “The Much Honoured Richard Lauder of Houlton” ou “The Much Honoured The Laird of Houlton” or “The Much Honoured Richard Lauder, Laird of Houlton” (“O Ilustríssimo Richard Lauder, Senhor de Houlton”). Caso venda a propriedade, o título a acompanhará.
Morgado era o detentor de uma propriedade instituída pelo rei, chamada morgadio, que não podia ser vendida ou dividida sem autorização do rei (embora pudesse ser ampliada) e tinha de ser legada na íntegra ao primogênito. Esse tipo de propriedade foi abolido em 1863, junto com o título.
Escudeiro hereditário (em inglês, esquire, em francês écuyer) – era automaticamente, em alguns países, qualquer fidalgo que não tivesse outro título. Na Inglaterra, outrora era passado apenas de pai para filho primogênito, a partir do filho primogênito de um cavaleiro ou do cadete de um lorde, ou de um escudeiro instituído como tal por um rei ou grande senhor e constituía a camada superior da fidalguia. Atualmente, porém, o título de esquire pode ser usado por qualquer um no Reino Unido, assinando-se Fulano de Tal, Esq. (nos EUA, é reservado a advogados e advogadas, análogo ao brasileiro “doutor”). Vale notar que a grafia em inglês é diferente de squire, o escudeiro no sentido original, militar, da palavra.
Donzel, depois Moço da câmara ou Pajem (em inglês e francês page ou valet) era originalmente o jovem infanção ou fidalgo que presta serviço a um cavaleiro ou senhor, podendo então (mas não necessariamente) ser armado Cavaleiro por um rei ou senhor feudal. Em Portugal, na Idade Moderna, fazia-se uma distinção entre a carreira da nobreza inferior, de segundo grau – Moço da câmara, Escudeiro Fidalgo e Cavaleiro Fidalgo – e a de primeiro grau – Moço fidalgo, Fidalgo escudeiro e Fidalgo cavaleiro.
52 Comments
Que belo artigo!
Poderia ser publicado por uma revista (magazine), por ex., a Superinteressante.
Achei esclarecedor. Mas, como leio muitos livros de romances de época, eles usam muito duques e condes nos livros. No século 19 não é algo tão raro encontrar duques e outros títulos assim como o modo que são tratados. E são todos na Inglaterra. Isso difere do texto, já que é baseado mais na alta Idade Média, certo?
Nossa, que explicação mais esclarecedora. Ler [10]
vale a pena. Muito bom o texto, meus parabéns.
Quero expressar meus sinceros agradecimentos. Estou escrevendo um livro de romance escocês que se passa no ano de 1200 e essas informações me serão muito úteis.
Ficamos felizes em saber! E esse é o nosso objetivo: compartilhar conhecimentos e oferecer conteúdos de qualidade. Prosperidade, Emilene.
Gostaria de saber se essas referências se aplicam aos portugueses do século XV. E onde se obter o reconhecimento pelo Vaticano, de Títulos da Monarquiaria portuguesa.
No caso da família Ribeiro, ter tido ligações familiares com a Espanha, qual a que prevalece.
Outra dúvida , é se prevalece a parte do pai ou da mãe, ou de ambos.
Grata desde já.
Rosangela Ribeiro
Obrigado foi muito útil principalmente quando se escreve um romance e precisa saber usar os títulos de nobreza
Obrigado foi muito útil principalmente para os meus romances pois eu não sabia muito sobre os títulos de nobreza!
Olá Antonio,
Agradeço muito seu precioso texto com informações tão precisas.
Você sabe algo sobre os boiardos, nobreza russa não titulada?
Gostaria também de saber algo sobre a partícula roz antecedendo um sobrenome russo.
Muito obrigada.
Grande abraço,
Nicolette
Agora eu quero ver a nova Série da HBO, togetherness.
Olá.
Estava pesquisando sobre titulos de hierarquia para desenvolver o minha série e, apesar de não ter lido todo o texto, vejo quão rico e sério é o seu texto. Muito obrigado mesmo! Há muito tempo venho procurando informações para minha pesquisa e não encontro nada de útil ou relevante. Você salvou o meu sonho de continuar escrevendo.
Uma pergunta, sempre que for mencionar algum título, as palavras devem começarem com letras maiúsculas ?
Eu gostaria de saber um titulo que ouço sempre em seriados tais como The Tudors e The Borgias, (nao sei como se escreve) mais e algo do tipo “My Legys” que pra tradução em português é (Meu Soberano), tentei achar essa frase no Google tradutor mais ele da outro modo de escrita para a palavra “Soberano” e eu gostaria de saber como se escreve essa palavra da maneira correta.
Por favor sera que da pra alguém me ajudar, desde já agradeço
Oi Fabiano, tudo bem?
Boa pergunta! O que você ouve nos seriados é provavelmente o termo “My liege” – “Meu soberano”.
Abraços!
Casualmente descobri este blog. O conteúdo é enriquecedor. As informações detalhadas constituem um verdadeiro ‘tesouro do conhecimento’. Saber não ocupa espaço e é sempre oportuno ampliá-lo. Quando vejo Chefes de Cerimonial enfrentando verdadeiras ‘saias justas’ em eventos e cerimônias protocolares, cometendo verdadeiros fiascos em escala nacional e global, consigo visualizar o quanto vale o verdadeiro conhecimento da matéria. Muitas pessoas se aventuram a adentrar os portais da etiqueta e protocolo, mas, muito poucas entre estas estão realmente capacitadas para o exercício de cargos, funções ou colocarem-se como referenciais para o público leigo. Finalizando, quero parabenizar os autores da matéria e desejar a todos que continuem nesta trilha de sucesso.
Uma pergunta, estou escrevendo sobre o Rei Arthur, queria saber na escala de títulos o que era o cargo de Merlin, sei que Emrys é seu verdadeiro nome e que merlin é o cargo que ele ocupava, mas que cargo é esse???
Também gostaria de saber a bibliografia utilizada. Eu estou encontrando uma certa dificuldade em encontrar bons e objetivos textos sobre o Reino Unido do século 19, mas esse me ajudou bastante…
nenhum titulo a mim interessa, no livro do exodo da biblia sagrada, o rico e o pobre perante o Senhor Deus tem o mesmo nivel, quando o Senhor Jesus Cristo andava no meio do seu povo, ele dizia, o rei e o escravo tem o mesmo direito. isto é para os orgulhosos, por que deste mundo só leva as obras.
Simplesmente espetacular.
Parabéns pelo trabalho.
Olá, você disse acima que não se pode usar Lady/ Lord apenas com o primeiro nome, certo? Mas lendo A song of Ice and fire, eu vejo que as vezes chamam, por exemplo, a Catelyn Stark, de Lady Stark, e também apenas de Lady Catelyn. Há outras coisas que você escreveu também que diz ser errado, e que já vi em outros Best Sellers. O que é realmente certo? e até aonde podemos ir porque queremos, porque estamos criando? Tudo o que você disse acima é realmente absoluto? Digo isso, porque não gosto de ler coisas na internet achando que é o certo absoluto das coisas apenas para me deixar louca pensando que tudo o o que penso é errado, quando logo vejo em outros livros, autores escrevendo de tal modo sem ter seu mundo abalado. Agradeço uma resposta. ;D
PS: Se soei dramática ou ofensiva, me desculpe, não foi minha intenção. Apenas estou tentando mostrar o meu ponto, e aprender. Tenho certeza que suas informações são muito úteis, apenas tenho minhas dúvidas. Obrigada.
Olá, não sou o autor do texto, mas uma coisa que posso atestar é pela qualidade da pesquisa, que é bastante minuciosa. Uma coisa assustadora é saber que há muitos erros publicados em textos de editoras grandes, pequenas, médias e na internet, claro. 🙂 Por isso, não duvide, as pessoas erram muito em todas as áreas.
Yas (é esse nome mesmo?) em Crônicas de Gelo e Fogo, o Martin utiliza várias referências da idade média Europeia mas são só referências. Muitos dos títulos utilizados por ele nos livros foram inventados por ele mesmo. Da mesma forma, ele também adaptou alguns títulos conhecidos para se encaixar com a narrativa dele, sem se prender aos padrões existentes.
Espero ter tirado tua dúvida.
^^
Acredito que essas minúcias se aplicam mais a quem escreve ficção histórica. Você está se referindo a livros de Fantasia, que usam mais esses títulos por estética do que realmente formalidade. Embora A song of ice and fire seja famoso por sua estruturação de mundo, ele só precisa seguir a estrutura do próprio mundo, não a do nosso.
Rever textos [6]
o/ Sorte que achei isso antes de começar a terceira reescrita do meu livro, era exatamente o que eu procurava!
Ótimo texto, parabéns pela paciência de escrevê-lo!
Meus parabéns! adoro ler sobre esse assunto e você condensou um estudo interessante. Legal a parte dos pronomes de tratamento, e nisso realmente se verifica muitos erros nas séries e filmes medievais. Assistindo mesmo à Guerra dos Tronos, você nota constantemente Reis e Rainhas sendo chamados de Vossa Graça, quando o certo seria Vossa Majestade. Aliás, eles chamam Vossa Graça pra todo mundo que seja um Senhor de terras. Embora seu enfoque tenha sido a nobreza medieval, mas muitos erros ocorrem também com títulos eclesiásticos, vi principalmente em The Bórgias, The Tudors, e nos Pilares da Terra, bispos comuns serem chamados de Eminência, ou então de que é próprio de cardeais, e não Vossa Excelência Reverendíssima.
Qual título de nobreza é atribuído ao sobrinho do Rei?
Segundo dedução lógica e seguindo a Hierarquia da nobreza o sobrinho do rei seria INFANTE.
Espero ter ajudado. Saudações
Parabéns. Posso sugerir que esclareça as formas de tratamento de outros cargos com proeminência sistémica durante a Monarquia, como por exemplo, os Pares do Reino, o Presidente da Câmara dos Pares do Reino, os Embaixadores, os Cônsules, etc?
Legal o estudo. Quais as fontes bibliográficas você utilizou?
Muito bom o texto. Faltaram apenas as referências bibliográficas.
Cara, seu texto é o melhor de todos que li o ano inteiro. Apesar de bióloga, sempre me interessei muito por história, principalmente medieval. Mas nunca tive noção de que eram tantos títulos, e que esses tratamentos e nomes vivem até hoje de outras formas!
Eu gostaria de me aprofundar no assunto. Na verdade, eu gostaria de saber mais sobre como eram os casamentos nessa época (Quem podia casar com quem? Era mesmo algo tão restrito? Como eram os casamentos arranjados?) e sobre mulheres que tinham terras ou títulos que normalmente não teriam (Nos fazem pensar que não existia nenhuma, mas vejo sempre que existem várias exceções!). O que me recomendaria para pesquisa? 🙂
Que estudo maravilhoso, cara. Sempre pesquisei sobre o assunto pra contextualizar melhor minhas histórias de fantasia, e até cheguei a criar um post sobre antigas profissões no meu blog pessoal (cujo link está aí no meu nome), mas esse texto aqui está matador. Guardei aqui nos meus arquivos e vou usá-lo bastante. Além disso propagandearei de todo jeito que puder (escrevendo sobre ele no blog, twittando, etc)! Parabéns!
Baita estudo! Favoritado e retuitado, facebookizado e taos
Obrigado!
Oi, Antonio!
Parabéns pelo texto!
Principalmente, devo parabenizar sua paciência para escrevê-lo.
Para mim o assunto é conhecido, mas sou estudante e entusiasta do assunto.
Achei ótima sua iniciativa, pois é um tanto incômodo quando pego os erros nos livros… Não consigo superar, rs.
Um abraço.
Genial! É um perfeito guia para escritores como eu que se aventuram em épocas tão distintas! Foi uma reunião de informações que merece dezenas de parabéns, embora eu também tenha sentido falta da bibliografia.
Eu realmente aguardava um post assim. Obrigada!
Ola querida:
Sou historiador autonomo , vi teu anuncio nescessito contact com voce , se possivel.
Meu face-book name / e ( gawain galvao
thanks so lot .
Um post coerente, bem explicado e com ótimas informações para todos nós. Parabéns Antônio e toda a Editora Draco o/
Muito robusto e cheio de propriedade.
Realmente, “hora de rever os textos”… Meus parabéns!
Post maravilhoso, o tipo de post para se guardar e, antes de escrever qualquer coisa que use títulos de nobreza ou nobiliárquicos, reler. E claro, reler enquanto se escreve e após ter escrito. E quem saber reler quando der um momento de tédio e quiser fixar alguns conceitos? Parabéns!
*Guardando nos textos de referência*
Caramba, isso é praticamente uma monografia. o.O
Rever textos [5]
Muito esclarecedor, eu não uso muito essas épocas em meus contos, e agora vejo que as pouquíssimas vezes que escrevi sobre, ao menos sobre o modo de se dirigir, eu aceitei ^^ E tem bastante coisa aí que eu não sabia…
Realmente muito útil!
Excelente manual, Antônio. Bem completo, fácil de entender e útil para quem precisa de informações sobre o tema.
Ótima referência e merece divulgação!
MUITO legal o texto, Antonio! Extremamente instrutivo e esclarecedor. Vou divulgar já. Só senti falta de referências bibliográficas, que considero imprescindíveis. Beijão! 😉
Este é um texto raro em língua portuguesa! Para guardar nos favoritos, twittar, etc.
Completo e esclarecedor. Obrigado por nos brindar com artigo tão bem escrito.
Parabéns!
rever textos [4]
só tô com medo da versão estendida do manual >_<
UAU!!!
Texto muito esclarecedor! Não sou escritor, mas sempre é útil e interessante saber dessas coisas.
Obs: Na primeira tabela de saudações talvez você tenha se enganado e repetido a saudação “Vossa senhoria, senhor Marquês de” na linha do “Conde/Condessa”.
Belo blog!
Hora de rever TODOS os meus textos…
Estamos juntos, Sir. (ops!)
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