A farta cabeleira opaca loiro-rato caía em volta de sua face e descia até o meio das costas feito uma juba. Vestia uma tanga puída que mal cobria-lhe os ossos protuberantes. Naquele estado miserável, não aparentava ser ameaçador como diziam e não parecia justificada a presença de dois tratadores armados ali. Mas os olhos…! Eram verdes e tão humanos quanto podiam ser. Faiscavam com um brilho que expressava compreensão, sofrimento e ódio, muito ódio.
– Este rapaz nos tem dado bastante trabalho. Ninguém pode com ele e temo ter que sacrificá-lo… Seria um terrível prejuízo. – O Sr. W.G. explicou-se. Quis pensar que minhas motivações eram mais altruistas, mas enquanto o Sr. W.G. via o mimesia como uma mina de ouro, eu o enxergava como um objeto de estudo.
Jaulas é uma daquelas histórias que surgem de um lugar inusitado e que ficam muito tempo encubadas, esperando a oportunidade certa para vir à tona. E fiquei muito feliz que tenha sido na coletânea Boy`s Love, este projeto tão especial que tive o prazer de organizar.
A ideia central surgiu em uma aula de biologia, há mais de 10 anos, quando eu soube de um terrível segredo sobre os nossos antepassados remotos, os homens de Cro-Magnon. Estes homens pré-históricos conviveram – não nos melhores termos – com outra espécie de homens, os Neanderthal. E embora acredite-se que possamos ter herdado algum DNA Neanderthal, todos os seres humanos atuais são Homo Sapiens. Isto me levou a duas constatações chocantes: 1, a evolução não é linear, outros ramos evolutivos poderiam ter produzido novos tipos de vida racional e 2, em algum momento os nossos antepassados talvez não fossem a única criatura que pudéssemos avaliar como sendo… “gente”.
E assim, destas duas observações, imediatamente nasceram “mimesia”, humanoides descobertos em isolamento, para o fascínio da sociedade do século XIX. O momento perfeito! Nem bem o conceito de evolução fora digerido, ciência e religião começavam a conflitar e bum! uma nova espécie surge no cenário para tornar tudo ainda mais complexo.
Naturalmente, onde há o curioso e o extraordinário, há a figura do cientista. Daí surgiu L.N., um jovem e excitável naturalista fascinado pela nova descoberta e disposto a tudo para estudar os mimesia, até a cometer crimes. Tudo em nome da ciência… ou seria do amor?
Não foi muito fácil gestar esse conto. Só consegui organizar as várias ideias soltas de forma mais ou menos coerente no curso de verão de produção de mangá lecionado pela minha grande amiga Bia Costa. O preciosismo aliado ao medo de “cometer” várias “licenças poéticas” fez com que consumisse doses quase letais de filmes e literatura sobre o período Vitoriano e mais um monte de assuntos sobre os quais não tenho formação para escrever (não sem a aprovação da minha beta Deneb Rhode, é claro!).
Com isso, dei o meu melhor para mostrar como teria sido este grande marco para a humanidade no microcosmo da relação de um cientista e seu objeto de estudo, numa época em que tentávamos catalogar o mundo em nossas enciclopédias, em que começávamos a desconfiar que talvez, apenas talvez, não tivéssemos herdado a Terra sozinhos…
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