Conversamos com o Eduardo Kasse, autor do romance medieval fantástico O Andarilho das Sombras, primeiro livro da Série Tempos de Sangue. Ele também participa da coletânea Imaginários – contos de fantasia, ficção científica e terror v.5 com o conto “Sobre guerras e deuses”.
Veja algumas das influências literárias do Eduardo e saiba como elas foram essenciais para ajudar a formar seu perfil como escritor.
1 – O Silmarillion – J.R.R. Tolkien
Eduardo Kasse: Essa não é a obra mais famosa de Tolkien, entretanto, ela é excelente para entender a mitologia cunhada pelo autor, desde o início dos tempos até a criação dos anéis do poder que é a base da trilogia O Senhor dos Anéis.
O Silmarillion é um livro riquíssimo, tanto nas ambientações, quanto em relação aos personagens, principalmente os Valar e os Maiar, as divindades daquele universo.
Logo no início já há o capítulo – Ainulindalë, a música dos Ainur – que mostra perfeitamente e com grande força narrativa a criação do mundo e a “batalha” entre Melkor, com os maiores dons de poder e os demais Ainur. A dissonância na música e os efeitos dela no novo mundo foram magníficos e para mim já deram o tom do que viria pela frente. E isso realmente aconteceu!
Draco: Realmente, esse é um livro bem denso e repleto de histórias dentro da história. Isso se reflete na sua obra?
EK: Sim e muito! Gosto do suspense, da expectativa, por isso essas “pausas” na trajetória principal para contar histórias sobre os demais personagens fazem parte do meu estilo narrativo, acho que ajuda muito a prender a atenção do leitor com essas cenas rápidas.
Quanto à ambientação, não tenho o nível de detalhamento extremo de Tolkien, mas sempre procuro tentar transcrever a “imagem” daquilo que pensei para determinado trecho, seja por meio de descrições das construções ou vestimentas ou até mesmo por odores e sensações – ok, sei que isso não é uma imagem! rs.
Já sobre as características de personalidade, essas vão se desenrolando naturalmente durante a trama, assim como quando se conhece uma pessoa nova e a nossa percepção sobre ela vai sendo montada durante o tempo e a convivência.
É assim que gosto de passar a mensagem aos leitores.
2 – As Crônicas de Artur – Bernard Cornwell
EK: A visão do autor sobre a saga Arturiana é bem interessante, aliás, das que eu conheço, acho a mais convincente. A caracterização de Merlin, Nimue e do próprio Artur está muito bem feita e – arrisco dizer – plenamente factível!
A mistura entre lendas, magia e guerra cria uma história empolgante, que desde o início prende a atenção, principalmente em relação ao conflito entre os saxões e os homens da Britânia. É possível fazer uma viagem mental até os campos gramados e as florestas escuras daquela época.
Dá para imaginar o barulho da batalha, metal contra metal, gritos de dor, choro desesperado…
Draco: Seu livro O Andarilho das Sombras também se passa na Inglaterra em sua maior parte. No que ele se assemelha com os escritos de Cornwell?
EK: Não há como negar que as nossas leituras influenciam diretamente nos nossos textos. Obviamente, tenho o meu estilo, mas muitos cenários, descrições de lutas – uma maneira mais próxima ao real, sem eufemismos ou “maquiagem” – lembram muito a narrativa de Bernard Cornwell.
Aliás, recomendo muito a leitura de outras obras dele: Crônicas Saxônicas (ainda em andamento), A busca pelo Graal (trilogia) e os livros Stonehenge e Azincourt.
Quem gosta da história britânica certamente terá bons momentos de lazer.
3 – Portões de Fogo – Steven Pressfield
EK: Houve um tempo no qual os homens baseavam suas vidas na virtude, na honra aos companheiros, às suas mulheres e aos deuses. Um tempo em que muitos escreveram seus nomes na história. E um rei virou lenda.
No livro Portões de Fogo, um romance épico de Steven Pressfield sobre a Batalha das Termópilas, somos levados até a Grécia antiga e ao cenário onde 300 espartanos e outros bravos guerreiros detiveram a investida inicial da massiva invasão Persa do rei Xerxes, um exército de milhões de lutadores vindos de toda a Ásia.
Draco: Vemos que você é um grande apreciador dos momentos “épicos” da história mundial. Encontramos isso em alguma parte do seu livro?
EK: Para criar a narrativa do O Andarilho das Sombras, tomei a liberdade de usar muitos fatos e lugares reais. Permeei-os com a minha visão de como poderia ter sido, assim, há cenas muito interessantes como a morte de uma imperatriz – suspense! –, os primeiros “ensaios” da Inquisição e como a Peste dizimou uma cidade.
Lógico que esse não é o foco do livro, mas certamente, a história fica muito mais intrigante dessa maneira. Desperta a curiosidade. E arrisco dizer… Eu mesmo me peguei por diversas vezes pensando: “por que não?”. rs.
4 – As Crônicas Vampirescas – Anne Rice
EK: Lestat, Louis, Armand, Akasha, Marius… Tantos vampiros fascinantes fazem parte desse universo magnífico criado pela autora. A história percorre milênios, do Egito antigo até os dias de hoje, e conta a evolução dos personagens, com suas descobertas, seu fortalecimento e mesmo seu sofrimento eterno.
Anne Rice foge dos clichês e trabalha com maestria cada capítulo – apesar de ser uma série extensa, com 10 livros, a leitura é fluida e muito prazerosa. Enfim, os vampiros não são meros sugadores de sangue. E a imortalidade é vista sem pieguice.
Draco: Como vocês tratam de um tema muito parecido, não posso deixar de perguntar: você se espelhou nos livros de Anne Rice para criar a sua obra?
EK: Não posso negar essa influência, mas há uma diferença fundamental: Anne Rice trabalha mais com as sutilezas, com o subliminar e o psicológico. No meu livro, apesar de ter momentos de introspecção e reflexão dos personagens, há a ação mais crua, factual. Procurei entender e reproduzir como as coisas aconteceriam na “vida real”, entende? Como seria uma luta, uma mordida, um osso quebrado.
Mas, que fique bem claro: não recorri a nenhuma cobaia para isso! rs
Como falamos de Idade das Trevas, uma época de medo, fome, doença e guerras, não seria preciso, historicamente, usar amenidades para narrar os acontecimentos.
Aliás, para mim, esse é o grande mal de muitos autores contemporâneos: querem deixar tudo politicamente correto, mais suave…
Já vi barbaridades do tipo: o cara tem uma espada enfiada na barriga e sai um filete de sangue… NÃO! Se isso acontece, saem as tripas! O infeliz berra, tenta recolocá-las para dentro e agoniza! Rsrs.
Essa é a diferença de quem pensa no “estritamente comercial” para quem quer proporcionar uma experiência de imersão na leitura.
5 – O Nome da Rosa – Umberto Eco
EK: As investigações do frade franciscano William de Baskerville, com a ajuda do noviço Adso de Melk nos transportam diretamente para o monastério italiano no século XIV em que ocorreu o crime. Não vou me prolongar para evitar os spoilers.
O hábito e os costumes dos monges foram descritos com perfeição e a rotina do monastério beneditino, bem detalhada, é muito interessante para aqueles que desejam conhecer melhor sobre o período e contexto histórico narrado no livro.
Uma interessante batalha entre razão e dogmas! Entre interesses e pecados…
Draco: Igreja e dogmas são temas recorrentes no seu livro…
EK: E não haveria como ser diferente! A igreja católica era o maior poder da época, com influência direta sobre reis e camponeses, sobre a vida e a morte das pessoas.
Como Harold Stonecross podia ser considerado um “demônio”, um mal, certamente iria despertar a curiosidade e a fúria dos religiosos, afinal, era a supremacia da dominância que estava em jogo.
E a religião era – e é – imperfeita, por isso, os interesses individuais muitas vezes se sobrepunham ao bem coletivo.
Mas, para saber mais sobre essa batalha, só lendo O Andarilho das Sombras! rs
Até mais!
Eduardo Kasse é paulistano, nascido em 10 de abril de 1982. Escritor, palestrante e analista de conteúdos, vive nos mundos da literatura, do planejamento estratégico da informação e da edição de textos.
Site: www.eduardokasse.com.br – Twitter: @edkasse / Facebook: http://www.facebook.com/eduardokasse
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Quando crio uma história, um conto ou um romance como o meu livro O Andarilho das Sombras , preciso estruturar um planejamento dos cenários, das personagens e da “mensagem” que eu desejo passar. Para isso eu estudo fatos históricos, características físicas, como a aparência de cada um, cronologia, etc. Somente dessa maneira a narrativa fica concisa e fluente.
Primeira vez em que vejo um top 5 no qual conheço todos os livros citados… 🙂 Logo conhecerei também o seu, Eduardo!
Esses livros que indiquei são excelentes! Na verdade, dá vontade de fazer um TOP 10, 20, 50! Aliás, a cada livro que leio passo por uma (r)evolução. Sempre há alguma coisa para refletir.
Fico feliz que se interessou pelo meu livro! E espero que possamos interagir muito sobre “O Andarilho das Sombras”.
Até mais, Ana!