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[Top 5] Cláudio Parreira

Tendo como companheiros um ex-poeta bêbado e filosófico, uma mocinha nada virtuosa e centenas de retratos de Marilyn Monroe, o leitor descobrirá em Gabriel, romance de Claudio Parreira, que nem tudo é o que parece, que o Sagrado muitas vezes veste as calcinhas do Profano e que o pecado, nem sempre, conduz ao inferno.2.011 anos depois da sua mais importante missão, o anjo Gabriel é mandado novamente à Terra pelo Supremo com mais uma incumbência. Gabriel, porém, não é mais o mesmo. Os homens mudaram. Ao anjo não interessa mais as coisas do Céu, e a Terra com a qual se depara parece ter sido abandonada definitivamente por Deus. Dividido entre a fé e a indignação, o desejo e a raiva, Gabriel vaga por uma cidade sombria e em constante mutação, experimentando — e também curtindo — os absurdos da modernidade.

Depois de um pequeno intervalo, eis que o Draco Blog traz até vocês mais um Top 5. Dessa vez com o autor Cláudio Parreira, que vai falar um pouquinho das cinco maiores influências para seu anjo para lá de humano, Gabriel (é, aquele Gabriel).

Gabriel, romance cheio de malandragem e vigarice

Nas palavras do autor:

“Faz um tempão que assisti a um filme do argentino Fernando Birri, Um Senhor Muito Velho Com Umas Asas Enormes, baseado num conto homônimo de Gabriel García Márquez. Em resumo: durante uma tempestade, um anjo velho cai próximo à casa de uma modesta família e esse acontecimento altera todo o cotidiano do vilarejo.

Isso ficou na minha cabeça durante anos. Creio que nasceram, aí, o fascínio pelos anjos caídos e a ideia de GABRIEL.”

(Reparem que o vigarista Cláudio Parreira deu um jeitinho de falar de 6 influências no Top 5.)

 

1 – Je Vous Salue, Marie

Claudio Parreira: Esse filme de Jean-Luc Godard (veja aqui o trailer oficial), que criou polêmica à época do seu lançamento, 1985, foi o começo de tudo. Curti a ideia do cineasta abordar um tema tão controverso de maneira moderna e, ao mesmo tempo, irritar determinados setores da sociedade — principalmente a igreja. No filme, o próprio anjo Gabriel está presente, mas conforme manda o figurino — um anjo anunciador que não faz nada além de desempenhar o seu papel.

Por que não inverter a função do anjo, então?, pensei. A ideia fermentou durante muito tempo, mas só tive coragem de colocar no papel 10 anos depois. Mas o romance, mesmo, só veio à luz muito tempo mais tarde.

 

Draco: Você demora tanto tempo assim para escrever, ou é daqueles que nunca ficam satisfeitos com o resultado final?

CP: Normalmente não. Sempre me considerei essencialmente contista, e costumo resolver um conto com rapidez. Mas o gênero romance era, então, um medo. Daí a demora. Mas no fim o meu medo acabou virando loucura, o que se tornou divertido pra mim e para os leitores. Reescrevo bastante, mas não faço disso paranóia.

 

2 – William Burroughs e o Cut Up

 

Almoço Nu, de Burroughs (não o cara do Tarzan)

CP: Não, eu não gosto de textos lineares, em linha reta. Quando li Naked Lunch, do Burroughs, percebi que aquela era uma maneira interessante de escrever. Nesse livro, ele já usava o Cut Up, o corte (veja um exemplo aqui), técnica muito explorada lá pelo pessoal do Movimento Dadaísta no início do século 20.

Uso muito o Cut Up em GABRIEL — da minha maneira. Gosto de cortar para retomar mais adiante, acho que assim a leitura se torna dinâmica e ao mesmo tempo intrigante. Mas essa coisa do corte aprendi mesmo foi nos filmes. Acho fantástico o passar de uma cena à outra, e outra, para depois juntar tudo no final e dar um sentido àquilo que a princípio pode parecer ilógico. Claro que o que escrevo não tem nada a ver com a técnica do Burroughs (nem com a sua temática) — mas é um desdobramento disso

 

Draco: Parece que as suas grandes referências vêm do cinema.
É isso?

CP: Sim, mas não só. Aliás, hoje já não frequento as salas com tanta frequência. Preguiça, preço, et cetera. TVjo mais que tudo. As minhas referências, na verdade, vêm de todos os lados: do bar, da rua, das conversas alheias que eu colho diariamente. Porque escrever é, antes de tudo, estar atento. E das leituras que faço. Tenho visto muita gente boa surgindo por aí — e isso é animador.

 

3 – O Iluminado

 

O Iluminado

 CP: Difícil não citar este livro do mestre King como influência. Mais difícil ainda é não se lembrar da versão para o cinema de Stanley Kubrick. Tudo isso, de alguma forma, mesmo que diluída, está presente em GABRIEL. Como na cena em que o Embaixador se defronta com seus próprios fantasmas num balcão de bar cujo barman é ninguém menos que o Vermelho.

Draco: Essa cena, aliás, se passa dentro de um navio encalhado no meio da cidade. De onde veio isso? Do filme O Dia Depois de Amanhã?

CP: Não. Pra mim, a literatura (a arte) tem sempre que apresentar alguma coisa fora do lugar, absurda. É isso que a torna atraente aos meus olhos, aos meus sentidos. Uma coisa de miragem, de delírio. Gosto de introduzir o fantástico no meio do nosso caos cotidiano. E qualquer coisa que pareça estar fora do lugar, dentro daqueles padrões sociais estabelecidos, causa a delícia que é o estranhamento. É disso que eu gosto, é isso que persigo desde sempre. Quanto ao navio encalhado no meio da cidade, trataremos disso a seguir.

 

4 – Fitzcarraldo

Fitzcarraldo

CP: No filme de Werner Herzog, Fitzcarraldo, entre outras maluquices, decide, com a ajuda dos índios, levar um grande barco através de uma montanha para o meio da floresta amazônica. Essa cena ficou em minha cabeça para sempre. Não foi à toa, portanto, que encalhei um transatlântico entre prédios em plena cidade. Tudo, afinal, tem uma origem, e essa foi a maneira de me apropriar da ideia do cineasta, que achei (e continuo achando) genial. Claro que em GABRIEL eu misturo isso com outras referências, dentro dos meus objetivos, mas em síntese é aquilo que falei acima: o prazer de colocar o absurdo onde menos se espera.

 

Draco: GABRIEL é, ao mesmo tempo, um livro que se utiliza do humor para tocar em questões mais sérias. Em algum momento você hesitou, sentiu medo das reações mais conservadoras?

CP: Não. Desde o início sabia com o que estava lidando, e com os possíveis riscos. Mas eu precisava escrever a história, fazer a minha versão da história — do meu jeito. Se GABRIEL incomodar alguém, paciência. O que eu não poderia deixar de fazer era escrever aquilo que eu queria. Tenho, ainda, uma visão muito questionadora e ácida sobre a igreja, sobre a hipocrisia católica. O livro trata disso tudo, mas com muito humor. Faz pensar e rir, e acho que isso é fundamental.

 

Draco: Logo na epígrafe você cita o livro Aborto Celeste, de um autor chamado H.P. Bruesch. Quem é ele, e do que fala o livro, cujo título é bem forte?

CP: Bruesch era um livre-pensador renascentista. Já o Aborto Celeste foi o único livro que escreveu em vida, o que lhe custou muito caro. Mas essa história é muito longa para ser contada aqui.

 

5 – Marilyn & Madonna

 

 

CP: Não, eu não curto o som de Madonna. Sou mesmo é da turma do roquenrrou. Mas este clipe aqui, pelo que ele tem de provocador, me interessa muito.

À sua maneira, ela cutuca igreja, religião e sexualidade, desnuda (ops!) a hipocrisia e ainda bota fogo na cruz. Uau!

De maneira diferente, GABRIEL vai pelo mesmo caminho. E Marilyn, bem, Marilyn é pop, continua sendo, sempre será. Tenho certeza de que o papa — que também é pop — deve ter no Vaticano uma sala reservada só para as suas fotos. Ou vocês acham que isso é um privilégio apenas do Vermelho?

 

Claudio Parreira escrevia, escreve e continua escrevendo. Um doido. Mas não pretende se curar tão cedo. Seu maior sonho é ser a pedra no sapato de muita gente de bem. Parece que já está no caminho.

Pode ser encontrado aqui e aqui.

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